Não Tenha Medo de Falar
Ele abriu os olhos. E acolheu todos os sentimentos, mesmo o medo. Não queria ficar só. Virou o rosto contra o travesseiro, sentindo o contato com a fronha limpa. As lágrimas molhavam o pano, mas eram um consolo. As paredes não riam mais. Um sentimento novo encolhia-se dentro dele, em atitude de espera. Não sabia dar-lhe nome, mas isso não era essencial. O essencial que estava dentro dele, o novo sentimento — quente, amável — como se apontasse um caminho com o dedo em riste.
EU NÃO ENTENDO! Por medo da loucura, renunciei à verdade. Minhas ideias são inventadas. Eu não me responsabilizo por elas. O mais engraçado é que nunca aprendi a viver. Eu não sei nada. Só sei ir vivendo. Como o meu cachorro. Eu tenho medo do ótimo e do superlativo. Quando começa a ficar muito bom eu ou desconfio ou dou um passo para trás.
O medo agora é que meu novo modo não faça sentido? Mas por que não me deixo guiar pelo que for acontecendo? Terei que correr o sagrado risco do acaso. E substituirei o destino pela probabilidade.
O meu maior medo já aconteceu, era te perder. E o segundo maior está acontecendo: não conseguir te esquecer.
Chega em mim sem medo, toca meu ombro, olha nos meus olhos, como nas canções do rádio. Depois me diz: " - Vamos embora para um lugar limpo. Deixe tudo como está. Feche as portas, não pague as contas e nem conte a ninguém. Nada mais importa. Agora você me tem, agora eu tenho você. Nada mais importa. O resto? Ah, os restos são restos. E não importam. Mas seus livros, seus discos, quero perguntar, seus versos de rima rica? Mas meus livros, meus discos, meus versos de rima pobre? Não importa, não importa. Largo tudo.
Que vontade, que vontade enorme de dizer outra vez meu amor, depois de tanto tempo e tanto medo. Que vontade escapista e burra de encontrar noutro olhar que não o meu próprio - tão cansado, tão causado - qualquer coisa vasta e abstrata quanto, digamos assim, um caminho.
E eu só tenho a mim, eu só tenho a mim, repetiu, voltando a cair sobre a cama. Não posso sentir medo, não devo sentir medo, não quero sentir medo.
Te vejo perdendo-se todos os dias entre essas coisas vivas onde não estou. Tenho medo de (...) não estar no que você vê.
Oh Deus, como estou sendo feliz. O que estraga a felicidade é o medo.
Quero te fazer compreender que não é assim, que tenho um medo cada vez maior do que vou sentindo em todos esses meses, e não se soluciona.
PRECE DA CRIANÇA
Senhor,
estou muito assustado,
estão nos fazendo medo,
fico até cansado de pensar
um jeito de proibir os adultos
de matar os passarinhos,
de acabar com os rios,
de poluir os mares.
Tudo que o Senhor fez é tão bonito,
até me irrito, quando vejo guerras
dominando alguns lugares.
Quero sonhar
com uma escola feliz,
com professores sorrindo,
e uma nota que dê para passar...
É isto que sempre quis.
Ah!
Quero minha família unida,
segurança para brincar na praça,
a imensa graça, de dormir,
sabendo
que se há alguém na rua
vai poder voltar.
Amém.
Publicado no meu livro Amanhecer-3ª.Ed Reproart-RJ 2004
Eu que não me lembrara de lhe avisar que sem o medo havia o mundo.
O único medo que você deve parar de sentir é o de sentir medo, pois medo é uma coisa natural e nos protege das situações de perigo. Ele não deve ser abolido, mas enfrentado.
Quando você entender que ele é uma coisa normal e não um bicho de sete cabeças - ele não quer te engolir - aí o medo será vencido, ou seja, você terá aprendido a lidar com ele.