Mini Textos de Ana Maria Braga

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É no olhar, sobretudo, que a amizade se confirma. É no jeito de olhar que nos reconhecemos no primeiro momento, nós, amigos recentes de longas datas. Isso porque amigo tem esse olhar bom: ele nos olha como se realmente quisesse nos ver, sem nenhum outro interesse que não seja a oportunidade boa e rara de partilhar amizade. Ele nos vê e permanece ao nosso lado, esse conforto que palavra alguma é capaz de traduzir. Esse detalhe grandioso que faz toda a mágica acontecer, porque amar é também a arte de cuidar com os olhos.

Ninguém é igual a ninguém, eu sei. Não posso querer que você seja de um jeito que não é o seu. E se eu gosto, tenho que gostar por inteiro. Mesmo com defeitos, mesmo com passado, mesmo com tudo. Eu também tenho a minha história, com partes bonitas e feias. E quando duas vidas se cruzam, com tudo de errado e certo, é a gente que escolhe ficar. E foi essa a escolha que nós fizemos. A gente tinha tudo pra dar errado. Mas demos certo.

Muitas vezes dizemos amar, mas estamos só desrespeitando. Dizemos amar, mas estamos só impondo. Dizemos amar, mas estamos só olhando para nós mesmos. Dizemos amar, mas estamos só fazendo adoecer as belezas disponíveis. Dizemos amar, mas estamos só amarrando sementes e calando primaveras. Dizemos amar, mas estamos só inflando nuvens que escondem cada vez mais o sol. Dizemos amar, mas estamos só dizendo. Amor tem outro cheiro. Outra natureza. Outra frequência. Outro chamado. É para ser luz pra dois, com todas as sombras de cada um.

O coração da gente gosta de atenção. De cuidados cotidianos. De mimos repentinos. De ser alimentado com iguarias finas, como a beleza, o riso, o afeto. Gosta quando espalhamos os seus brinquedos no chão e sentamos com ele para brincar. E há momentos em que tudo o que ele precisa é que preparemos banhos de imersão na quietude para lavarmos, uma a uma, as partes que lhe doem. É que o levemos para revisitar, na memória, instantes ensolarados de amor capazes de ajudá-lo a mudar a freqüência do sentimento. Há momentos em que tudo o que precisa é que reservemos algum tempo a sós com ele para desapertá-lo com toda delicadeza possível. Coração precisa de espaço.

Tomara que os nossos enganos mais devastadores não nos roubem o entusiasmo para semear de novo. Que a lembrança dos pés feridos quando, valentes, descalçamos os sentimentos, não nos tire a coragem da confiança. Que sempre que doer muito, os cansaços da gente encontrem um lugar de paz para descansar na varanda mais calma da nossa mente. Que o medo exista, porque ele existe, mas que não tenha tamanho para ceifar o nosso amor.

Não sei exatamente em que momento comecei a despertar. Só sei que comecei a compreender o respeito e a reverência que a experiência humana merece. A me dar conta de delícias que passaram despercebidas durante um sono inteiro. E a lembrar do que estou fazendo aqui. Ainda que eu não faça. Ainda que os vícios que o sono deixou costumem me atrapalhar. Ainda que, de vez em quando, finja continuar dormindo. Mas não tenho mais tanta pressa. Comecei a aprender a ser mais gentil com o meu passo. Afinal, não há lugar algum para chegar além de mim. Eu sou a viajante e a viagem.

Há saudades que caminham comigo aconchegadas num lugar gostoso que a memória tem. São porta-jóias que guardam encantos que não morrem. Caixinhas de música, que, ao serem abertas, derramam melodias que me fazem dançar com elas de novo. São saudades capazes de amenizar o frio de alguns instantes com os seus braços de sol.

Algumas pessoas se destacam para nós. Não há argumento capaz de nos fazer entender exatamente como isso acontece.[...] Não importa quando as encontramos no nosso caminho. Parece que estão na nossa vida desde sempre e que mesmo depois dela permanecerão conosco.[...]É até possível que tenhamos sentido saudade mesmo antes de conhecê-las. O que sentimos vibra além dos papéis, das afinidades, da roupa de gente que usam. Transcende a forma. Remete à essência. Toca o que a gente não vê. O que não passa. O que é.

Chega um momento em que a gente se dá conta de que, às vezes, para sermos verdadeiros com nós mesmos, precisamos ter o desprendimento para abençoar as tentativas sem êxito, agradecer pelo o que cada uma nos ensinou, e seguir. De que, às vezes, para se reconstruir, é preciso demolir construções que, por mais atraentes que sejam, não são coerentes com a ideia da nossa vida. A gente se dá conta do quanto somos protegidos quando estamos em harmonia com o nosso coração. De que o nosso coração é essencialmente puro. Essencialmente, amoroso, o bordador capaz de tecer as belezas que se manifestam no território das formas. De que, sabedores ou não, é ele que tem as chaves para as portas que dão acesso aos jardins de Deus. E, vez ou outra, quando em plena comunhão criativa, entra lá, pega uma muda de planta e traz para fazê-la florescer no canteiro do mundo.

Eu não havia marcado hora pra viver aquele instante. Ele não estava anotado na agenda da minha expectativa. Não utilizei o tempo dos olhos na direção de calendários e relógios por aguardá-lo. Não me preparei para recebê-lo. Aconteceu de repente, feito chuva derramada de improviso, sem que o céu revele antecipadamente o seu desejo em alto e bom som. Quando percebi, eu estava lá e ele era perfeito.

Eu sou assim, essa metamorfose ambulante, menina que não sabe amar. Eu me dou, juro que sim! Me entrego com todos os mais verdadeiros sentimentos. Mas é difícil admitir que não sei amar. Talvez seja pelas inúmeras vezes que o AMOR me machucou. Sei que um dia vai aparecer um cara legal, com sentimentos legais e chegará pra me amar de verdade. Estou cheia desses caras que acham que sabem amar, porém no fundo só existe um coração vazio e uma necessidade de um corpo colado junto ao dele. Muitas vezes as necessidades físicas dos homens falam mais alto. Mas com certeza existe alguém que queira realmente ser amado e amar incondicionalmente alguém.

Como faz com toda gente,a vida já aprontou tantas comigo, já me testou emocionalmente de tantas maneiras, já cansou tanto a minha beleza com suas armadilhas medidoras de fé, que, no fim das contas, ou aqui bem no meio delas, ela me trouxe a graça e a liberdade de experimentar viver com um coração que não é de todo valente, mas que é humano. Coração humano é feito para o afeto, quer a gente consiga viver ou não esse chamado. Coração humano é feito as borboletas, imaginado para espalhar pólen de luz, alegria, bondade, amor, de incontáveis jeitos, nesse imenso jardim, com a vantagem preciosa de geralmente viver muito mais tempo do que elas. Coração humano, por essência, é criador de beleza. É rascunho de Deus pra gente passar a limpo. E quanta dor acontece, meu Deus, porque a gente não passa. Que me desculpem os apáticos: não tenho medo de sentir, eu sinto muito.

Ser sensível nesse mundo requer muita coragem. Muita. Todo dia. Esse jeito de ver além dos olhos, de ouvir além dos ouvidos, de sentir a textura do sentimento alheio, tão clara, no próprio coração. Essa sensação, às vezes, de ser estrangeiro e não saber falar o idioma local, de ser meio ET, uma espécie de sobrevivente de uma civilização extinta. Essa intensidade toda em tempo de ternura minguada. Esse amor tão vivido em terra em que a maioria parece se assustar mais com o afeto do que com a indelicadeza. Esse cuidado espontâneo com os outros. Essa vontade tão pura de que ninguém sofra por nada. Esse melindre de ferir por saber, com nitidez, como dói ser ferido. Ser sensível nesse mundo requer muita coragem. Muita. Todo dia.

Ana Jácomo

Nota: A autoria do texto tem vindo a ser erroneamente atribuída a Emmanuel.

A vida tem uma sabedoria que nem sempre alcanço, mas que eu tenho aprendido a respeitar, cada vez mais com fé e liberdade. O tempo, de vento em vento, desmanchou o penteado arrumadinho de várias certezas que eu tinha, e algumas vezes descabelou completamente a minha alma. Mesmo que isso tenha me assustado muito aqui e ali, no somatório de tudo, foi graça, alívio e abertura. A gente não precisa de certezas estáticas. A gente precisa é aprender a manha de saber se reinventar. De se tornar manhã novíssima depois de cada longa noite escura. De duvidar até acreditar com o coração isento das crenças alheias. A gente precisa é saber criar espaço, não importa o tamanho dos apertos. A gente precisa é de um olhar fresco, que não envelhece, apesar de tudo o que já viu. É de um amor que não enruga, apesar das memórias todas na pele do coração. A gente precisa é deixar de ser sobrevivente para, finalmente, viver.

Abençoadas sejam as surpresas risonhas do caminho. As belezas que se mostram sem fazer suspense. As afeições compartilhadas sem esforço. As vezes em que a vida nos tira pra dançar sem nos dar tempo de recusar o convite. As maravilhas todas da natureza, sempre surpreendentes, à espera da nossa entrega apreciativa. A compreensão que floresce, clara e mansa, quando os olhos que veem são da bondade. Abençoados sejam os presentes fáceis de serem abertos. Os encantos que desnudam o erotismo da alma. Os momentos felizes que passam longe das catracas da expectativa. Os improvisos bons que desmancham o penteado arrumadinho dos roteiros da gente. Os diálogos que acontecem no idioma pátrio do coração. Abençoada seja a leveza, meu Deus.

Tenho uma amiga que diante das circunstâncias mais difíceis costuma afirmar: “E isto também passará!” Pura verdade. Tudo passa. Nada permanece inalterado. Nada permanece o tempo todo, do mesmo modo, no mesmo lugar. Inclusive aquilo que gostaríamos que não passasse nunca. Aprendi, embora tantas vezes esqueça e as circunstâncias me convidem a relembrar, que a ordem natural das coisas é a fluência, o movimento. O fechamento de um ciclo e a inauguração de outro.

Encontro das Águas

Vê bem, Maria aqui se cruzam: este
É o Rio Negro, aquele é o Solimões.
Vê bem como este contra aquele investe,
como as saudades com as recordações.

Vê como se separam duas águas,
Que se querem reunir, mas visualmente;
É um coração que quer reunir as mágoas
De um passado, às venturas de um presente.

É um simulacro só, que as águas donas
D'esta região não seguem o curso adverso,
Todas convergem para o Amazonas,
O real rei dos rios do Universo;

Para o velho Amazonas, Soberano
Que, no solo brasílio, tem o Paço;
Para o Amazonas, que nasceu humano,
Porque afinal é filho de um abraço!

Olha esta água, que é negra como tinta.
Posta nas mãos, é alva que faz gosto;
Dá por visto o nanquim com que se pinta,
Nos olhos, a paisagem de um desgosto.

Aquela outra parece amarelaça,
Muito, no entanto é também limpa, engana:
É direito a virtude quando passa
Pela flexível porta da choupana.

Que profundeza extraordinária, imensa,
Que profundeza, mais que desconforme!
Este navio é uma estrela, suspensa
Neste céu d'água, brutalmente enorme.

Se estes dois rios fôssemos, Maria,
Todas as vezes que nos encontramos,
Que Amazonas de amor não sairia
De mim, de ti, de nós que nos amamos!...

Oração dos Desesperados

Senhor, dê-me serenidade para aceitar as coisas que não posso mudar, a coragem para mudar as coisas que não posso aceitar e a sabedoria para esconder os corpos daquelas pessoas que eu tive que matar por estarem me enchendo o saco.

Também me ajude a ser cuidadoso com os calos em que piso hoje, pois eles podem estar conectados aos sacos que terei que puxar amanhã.

Ajude-me, sempre, a dar 100% no meu trabalho...
- 12% na segunda-feira,
- 23% na terça-feira,
- 40% na quarta-feira,
- 20% na quinta-feira,
- 5% na sexta-feira.

E... Ajude-me sempre a lembrar, quando estiver tendo um dia realmente ruim e todos parecerem estar me enchendo o saco, que são necessários 42 músculos para socar alguém e apenas 4 para estender meu dedo médio e mandá-lo para aquele lugar...

Que assim seja!

Viva todos os dias de sua vida como se fosse o último.
Um dia você acerta.

Desconhecido

Nota: A autoria do texto, conhecido também por "Oração dos Estressados" ou "Oração dos estressadinhos", é muitas vezes atribuída erroneamente a Luis Fernando Verissimo.

...Mais

Não estou bem...

Minha vida não é mais a mesma
Hoje sinto uma angústia enorme
Tô vivendo a velocidade de uma lesma
Me sinto um prisioneiro só que sem uniforme

Mas não é de qualquer prisão, é da pior
Prisioneiro da minha própria mente
Sempre uma tentativa falha de me sentir melhor
E tô mal novamente

Até queria ser alguém que desse orgulho pra todos ao meu redor
Não importa o quanto tente, eu não consigo
Chega a dar dó
E eu penso, será que o erro tá neles ou tá comigo?

Eu penso se um dia tudo isso vai melhorar
É bom um pouco de expectativa
Mas infelizmente sinto que nunca vai acabar
Às vezes sinto que minha alma não tá mais tão viva

Sinto que o que sou hoje só vai piorar
E mesmo assim não peço ajuda
Certeza que um dia minha ignorância vai me matar
Mas, infelizmente, até lá tenho que continuar na mesma coisa que nunca muda

Eu sei que não sou tão bom
Mas não devo ser o pior
Eu queria ter algum dom
Mas sempre fui inútil e descartável desde menor

Sonhava que iria dar orgulho a todos ao meu redor
Não tenho mais esperança
Hoje o meu melhor é o pior
E, assim, morre mais um sonho de criança...

Para onde vão as palavras de amor não ditas?
Esquecidas em orfanatos por serem precoces demais

Envelhecidas em asilos..
por terem enrugado e perdido a independência

Amarradas em camisa de força
por serem insanas e incontroláveis

Suplicando nas sarjetas
por precisarem de ajuda

Nas fotos dos desaparecidos
por um dia ter virado saudade

Se por ventura elas forem vistas por ai
diga que sinto fala.
sinto muita falta.