Frases de Mia Couto
Como ele sempre dissera: o rio e o coração, o que os une? O rio nunca está feito, como não está o coração. Ambos são sempre nascentes, sempre nascendo. Ou como eu hoje escrevo: milagre é o rio não findar mais. Milagre é o coração começar sempre no peito de outra vida.
"Conselhos de minha mãe foram apenas silêncios. Suas falas tinham o sotaque de nuvem”.
( em "O ultimo voo do flamingo". Lisboa: Editorial Caminho, 2000.)
“O amanhecer costumava ser um beijo no vidro de sua casa. Naquela manhã, porém, a luz era mais tensa do que intensa”.
(em "O outro pé da sereia". Lisboa: Editorial Caminho, 2006.)
"Eis o que descobri: as aranhas que observei sobre a mesa estiveram sempre dentro de mim. E dentro de mim fabricaram uma teia que me tolda não apenas os movimentos, mas toda a minha vida".
(in "Mulheres de Cinzas" página 236)
" Porque o amor é esquivadiço. A gente lhe monta casa, ele nasce no quintal". (in " Terra Sonâmbula ")
“A adiada enchente
Velho, não.
Entardecido, talvez.
Antigo, sim”.
(em "Idades cidades divindades". Lisboa: Editorial Caminho, 2007.)
“A uns satisfaz uma sombra,
a outros nem o mundo basta.
Uns batem com a porta,
outros hesitam como se não houvesse saída”
.
(em “Tradutor de chuvas”. Lisboa: Editorial Caminho, 2011).
“Amor se parece com a Vida:
ambos nascem na sede da palavra,
ambos morrem na palavra bebida”.
(trecho em "Idades cidades divindades". Lisboa: Editora Caminho, 2007.)
"Quero morar numa cidade onde se sonha com chuva. Num mundo onde chover é a maior felicidade. E onde todos chovemos”.
( em "Antes de nascer o mundo". São Paulo: Companhia das Letras, 2009.)
"A palavra de hoje é aquela que cada vez mais se despiu da dimensão poética e que não carrega nenhuma utopia sobre um mundo diferente”.
( em "E se Obama fosse africano?". Lisboa: Editorial Caminho, 2009)
De que vale ter voz
se só quando não falo é que me entendem?
De que vale acordar
se o que vivo é menos do que o que sonhei?
(VERSOS DO MENINO QUE FAZIA VERSOS)
(trecho extraído do livro “O fio das missangas”, Cia. das Letras, 2004, pág. 131.)
Os vindouros, esses que aguardam por corpo, são quem mais deveríamos temer. Porque deles sabemos o quase nada. Dos mortos ainda vamos recebendo recados, afeiçoamo-nos a suas familiares sombras.
Nunca o nosso mundo teve ao seu dispor tanta comunicação. E nunca foi tão dramática a nossa solidão. Nunca houve tanta estrada. E nunca nos visitámos tão pouco.
E o tempo comeu o chão.
Sem terra, sem rio, sem céu, não me restou
senão o vislumbrar
de um sonho.
E o sonho
foi ave e peixe,
foi tempo e foi céu.
Depois, aos poucos, o sonho me devorou a vida.
E, assim,
em mim,
nasceram todas as vidas.
O mar é o habilidoso desenhador de ausências.
Era como se o mar, com seus infinitos, lhe desse um alívio de sair daquele mundo.
O amor é como o mar: sendo infinito espera ainda em outra água se completar.
Na barriga da mãe, não se tece apenas um outro corpo. Fabrica-se a alma.
Sempre que chorares, nascerás uma outra vez.