Mensagens de Autores Famosos
Tudo o que mais valia exatamente ela não podia contar. Só falava tolices com as pessoas. Quando dizia a Rute, por exemplo, alguns segredos, ficava depois com raiva de Rute. O melhor era mesmo calar.
Não se pode dar uma prova da existência do que é mais verdadeiro, o jeito é acreditar. Acreditar chorando.
Se fosse dado às fêmeas cantar, ela não cantaria mas ficaria muito mais contente.
Tenho uma paz profunda, somente porque ela é profunda e não pode ser sequer atingida por mim mesmo. Se fosse alcançável por mim, eu não teria um minuto de paz.
E sobretudo há nessa existência primeira uma falta de erro, e um tom de emoção de quem poderia mentir mas não mente. Basta? Basta sim.
Foram então aprender que, não se estando distraído, o telefone não toca, e é preciso sair de casa para que a carta chegue, e quando o telefone finalmente toca, o deserto da espera já cortou os fios.
Nota: Trecho da crônica Por não estarem distraídos.
...MaisEntão não apanhei no chão o que reluzia. Era ouro, meu Deus. Era ouro, talvez.
Eu escrevo para fazer existir e para existir-me. Desde criança procuro o sopro da palavra que dá vida aos sussurros.
Achei graça na história do seu contínuo dar meu nome à filha... Que tola “heroína” eu sou! Enfim, o que vale é que é um nome normal.
Pedem-me pouco, pedem-me quase nada. O terrível é que eu tenho muito para dar e tenho que engolir esse muito e ainda por cima dizer como delicadeza: obrigada por receberem de mim um pouquinho de mim.
Quando vejo num caminhão uma placa dizendo: “Inflamável” – então me encho de glória.
O medo agora é que meu novo modo não faça sentido? Mas por que não me deixo guiar pelo que for acontecendo? Terei que correr o sagrado risco do acaso. E substituirei o destino pela probabilidade.
Mas é que também não sei que forma dar ao que me aconteceu. E sem dar uma forma, nada me existe. E – e se a realidade é mesmo que nada existiu?! Quem sabe nada me aconteceu? Só posso compreender o que me acontece mas só acontece o que eu compreendo – que sei do resto? O resto não existiu. Quem sabe nada existiu! Quem sabe me aconteceu apenas uma lenta e grande dissolução? E
que minha luta contra essa desintegração está sendo esta: a de tentar agora dar-lhe uma forma? Uma forma contorna o caos, uma forma dá construção à substância amorfa – a visão de uma carne infinita é a visão dos loucos, mas se eu cortar a carne em pedaços e distribuí-los pelos dias e pelas fomes – então ela não será mais a perdição e a loucura: será de novo a vida humanizada.
Cedo fui obrigada a reconhecer, sem lamentar, os esbarros de minha pouca inteligência, e eu desdizia caminho. Sabia que estava fadada a pensar pouco, raciocinar me restringia dentro de minha pele. Como, pois, inaugurar agora em mim o pensamento? E talvez só o pensamento me salvasse, tenho medo da paixão.
Já que tenho de salvar o dia de amanhã, já que tenho que ter uma forma porque não sinto força de ficar desorganizada, já que fatalmente precisarei enquadrar a monstruosa carne infinita e cortá-la em pedaços assimiláveis pelo tamanho de minha boca e pelo tamanho da visão de meus olhos, já que fatalmente sucumbirei à necessidade de forma que vem de meu pavor de ficar delimitada – então que pelo menos eu tenha a coragem de deixar que essa forma se forme sozinha como uma crosta que por si mesma endurece, a nebulosa de fogo que se esfria em terra. E que eu tenha a grande coragem de resistir à tentação de inventar uma forma.
(...) a mesma mansa loucura que até ontem era o meu modo sadio de caber num sistema. Terei que ter a coragem de usar um coração desprotegido e de ir falando para o nada e para o ninguém? Assim como uma criança pensa para o nada. E correr o risco de ser esmagada pelo acaso.
Não compreendo o que vi. E nem mesmo sei se vi, já que meus olhos terminaram não se diferenciando da coisa vista. Só por um inesperado tremor de linhas, só por uma anomalia na continuidade ininterrupta de minha civilização, é que por um átimo experimentei a vivificadora morte. A fina morte que me fez manusear o proibido tecido da vida.
É proibido dizer o nome da vida. E eu quase o disse. Quase não me pude desembaraçar de seu tecido, o que seria a destruição dentro de mim de minha época.
(...) viver é somente a altura a que posso chegar – meu único nível é viver.
(...) e nem ao menos quero que me seja explicado aquilo que para ser explicado teria que sair de si mesmo. Não quero que me seja explicado o que de novo precisaria da validação humana para ser interpretado.
Vida e morte foram minhas, e eu fui monstruosa. Minha coragem foi a de um sonâmbulo que simplesmente vai. Durante as horas de perdição tive a coragem de não compor nem organizar. E sobretudo a de não prever. Até então eu não tivera a coragem de me deixar guiar pelo que não conheço e em direção ao que não conheço: minhas previsões condicionavam de antemão o que eu veria. Não eram as antevisões da visão: já tinham o tamanho de meus cuidados. Minhas previsões me fechavam o mundo.