Meninos de Rua
O ARCO-ÍRIS
Margem do Capibaribe,
arco-íris, raridade,
cruza o céu do meu Recife
no meio da claridade.
Ele vem em boa hora
sobre a Rua da Aurora,
o postal da minha cidade.
Fica em Casa? Que casa? Isso é tudo que eu tenho, tenho sombra, tenho ajuda as vezes, tenho fantasmas que me perseguem 24 horas por dia, tenho anjos da guarda e essa solidão que é minha maior companhia. E isso muitas casas comuns tem também, então Tô em Casa! Memórias de um morador de rua.
Amarelo Rua a Baixo
Não foi fácil saber quais.
Amarelos que nem usas mais!
Nem descer aquela rua.
Alegre como o campo que não lá havia.
Fôramos apedrejados nesse dia.
Naquele frio,
Que ninguém tinha como nós,
Nem a nossa voz dizia ter sentido.
Mas as gotas do teu cabelo...
Essas sim!
Eram o "mim",
O pouco de ti,
O tudo dos teus e o nada,
Dos empertigados.
(nada que eu quisesse, pelo menos)
No dia em que fomos vistos a passar naquela rua,
Já nos conheciam,
Já lá haviam jardineiros,
Varredores rua a baixo...
Rua a cima!
E os porteiros do Jardim Botânico que nos viam
E os motoqueiros da Telepizza que nos deram!
Mas nesse dia era dia de Janeiro.
Não! Espera!
Era o dia que nos dera, como se fosse o ano inteiro!
Mas chegámos lá.
Ah!... Se chegámos lá, menina dos oníricos amarelos.
Lá a uma estrada,
A um rego de água
E a um caminho âmbar.
E lá alguém passava caminhando menos belo.
Sabendo tudo,
Não querendo dizer nada,
Mas alguém que passava disse:
- Deus vou ajude!
- Deus vou ajude meus filhos!
E ajudou tia!
Ajudou tia!
Tanto que sempre serei a forma da ponta do seu cajado!
Quanto a ti...
Não sei de ti nem pra onde foste!
Apenas deixaste os ganchos do teu cabelo
E a minha gaveta desarrumada.
A saudade da seda molhada
E da gota.
Garota, garota, garota!
É o que vejo agora na refracção da gota!
Três pontinhos.
Não chegam, garota!
Não chegam para cozer a ferida de felicidade,
Exposta pelo teu bisturi... na verdade.
Quando foi o teu estaladiço odor escarlate para depois?
Quando foi?
Quando foi a ferida sangrada pelas danças nocturnas dos dois?
Quando foi?
Pela foz do cais.
Pela voz do Rui.
Pela pedras marginais.
Pelo Porto sem sentido.
Pela cascata de mãos dadas,
No eco das Arrábidas!
Gritos felizes...
Berros no bruto pra escutar no ouvido.
Agora o Cronos,
Olha para o dia da ferida,
Para o depois da felicidade,
Para a parede fria... prá nostalgia
E vê-te a ti, garota,
Vê o teu bisturi,
Vê o corte de felicidade,
O desnorte
E os teus tais três pontos de Saudade!
Saudade, saudade, saudade de ti, garota!
Saudade dos amarelos que não usas mais.
e nada mais é
se não arte
uma bica
e um fim de tarde
em Marte
Antes de sair de casa aprendi a ladainha...
Se em Deus confio...
A ele entrego minha vida...
Enquanto na rua saio...
Querendo viver...
Fique você em casa...
Esperando sua hora de morrer...
Vou beber...
Jogar conversa fora...
Somente Deus sabe de minha hora...
Quero muito divertir..
Beber...
Conversar ...
Sorrir...
Enquanto você fica aí...
Por favor não me critique...
Esse é meu modo de saber...
Enquanto eu saio ..
Me divirto...
Fique em casa você...
A vida é só uma...
Para ela dou valor...
Deus que me abençoe...
Assim que sou...
Não sou homem...
De me dizerem o que tenho que fazer...
Não sou asno para me montar...
Eterno não vou ser...
Lhe respeito seu modo de pensar...
Afirmo...
Fique em casa você...
Meu coração é bem grande...
Vou amar....
Enquanto puder...
Sandro Paschoal Nogueira
Silêncio (microconto)
Caminhava tarde da noite pela rua Aurora. Quando estava a uns três quarteirões de casa, ouvi um choro vindo de um beco escuro. Me aproximei, olhei em seus olhos, e então, tudo se silenciou.
Aprendi desde muito novo que, sempre que nos fecham uma porta, devemos sair airosamente pela janela da rua.
Existem dias que, sem mais, sem menos, a gente se sente sem. E sem rumo, sem norte e sem bussola, sem sol e sem lua, sem casa e sem rua, sem amigos, sem graça e sem sal, sem bula e sem capital, sem ninguém nos esperando no porto, sem sonhos, sem nada para dar e sem receber, seguimos, assim, sem destino, sem querer. E assim, sem que ninguém perceba, sem que ninguém note, sem que ninguém saiba, deixamos de ser.
Amor de esquina,
Amor transbordante,
Amor que tropeça,
Amor que está ao alcance,
Amor de rua,
Amor debaixo da árvore,
Ventania dos dias,
Que leva o bem pra todos os cantos,
E leva o mal também,
Num tempo,
Uns seguem pela rua,
Outros ficam pelo chão,
Noutro tempo,
O chão dorme com uns,
E a rua acorda com outros da multidão
RUA DOS JUDEUS
Pelo chão daquela rua
Passa um trilho de trem.
Casarios bem antigos
A ruela também tem.
Do passado holandês
A sinagoga se fez
Pro judeu rezar amém.
(Homenagem à Rua do Bom Jesus, a antiga Rua dos Judeus, no centro do Recife, onde judeus se estabeleceram durante o domínio holandês em Pernambuco no século XVII).
MOTE: NA RUA DO ORIENTE TUDO ME FAZ REVIVER
UMA SAUDADE DE MENINO.
No anzol fisguei piaba no Acaraú.Em casa servia de almoço
Mamãe na cozinha fritava.Doze horas era aquele alvoroço
A rapadura nosso tira-gosto.Não sobrava pra ninguém
No fogão, o cuscuz bem quentinho.
Isso me fez amadurecer
NA RUA DO ORIENTE TUDO ME FAZ REVIVER
UMA SAUDADE DE MENINO.
A chuva torrencial tinha notas em graves e agudos molhados e saltitantes pelos caminhos que percorria sem parar. Era uma desvairada vontade de vencer obstáculos e chegar ao destino, mesmo sem saber onde este seria. Essa chuva repentina veio acordar o coração que dormitava, embalado por sonhos de verão, pés na areia, brisa marinha e gosto de sal nos lábios. Depois de abrir os olhos, senti-la e vê-la, vieram as lembranças de dias assim, cortinas fechadas, ausências e frio, quando outrora houve o adeus. Enquanto uma chuva assim caía, houve a partida, portas bateram sob o vento arrasador e que gemia junto às lágrimas do momento derradeiro. Não foi a chuva que provocou isso, foi a vida e junto às nuvens do tempo, em outro plano estás ainda a dizer: amo você e cada gotinha que caia, trazia o recado - a nostalgia do não mais...
"Escrevo com a ilusão de que posso consertar o mundo,
fazendo da caneta o martelo e das palavras os pregos.
Assola-me de maneira particular, o desejo de consertar, não a natureza, mas o coração das pessoas, que é uma máquina complicada onde tudo acontece.
Gostaria de poder franquear a porta do coração das pessoas, nem que fosse preciso usar o ombro ou um pé-de-cabra, a fim de deixar lá dentro, uma caixinha contendo sementes de amor.
Amor para gastar na rua
Amor para distribuir às pessoas mais queridas
e amor para uso próprio."
"Comece hoje e agora: saúda a quem deparares na rua, pode ser a única coisa que essa pessoa precisa para sentir-se realmente vivo"
Na rua onde moro não há falsidade
Somente a verdade que alguém escondeu
Há crianças na rua brincando
Entretidas e não lembrando que são mais velhas que eu
Na rua onde moro existe uma praça
Por lá um velho caça as glórias que viveu
Nela há um bebedouro
Onde vertia um tesouro que alguém distraído bebeu
Na rua onde moro impera a nostalgia
Lembranças de um estranho dia que nunca aconteceu
Histórias do bar da esquina
Onde morava uma menina que no vento se perdeu
Na rua onde moro as casa são vermelhas
Portas, janelas e telhas transparentes como eu
Pra visitar não tem segredo
Em sua mente perca o medo de criar um mundo seu
#Fique em casa
Aproveite essa quarentena
e seja um vasculhador
para tirar as sujeiras de seu teto.
Fácil demais, não?
Você tem um telhado a seu alcance,
por isso você tem cabeça.
Não podem fazer o mesmo,
os vasculhadores de cabo longo
que moram no bairro Ar Livre na Rua Padeça
Fácil demais, não?
Chamá-los de loucos,
“— Deus lhe favoreça”
Difícil demais, não?
Sem ter um telhado ao alcance,
como ficar em casa e ter cabeça?
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