Cecília Meireles (1901 – 1964) foi uma notória escritora brasileira que nasceu no Rio de Janeiro. Considerada uma das maiores poetas nacionais, a autora foi um dos nomes que mais se destacou no contexto do modernismo brasileiro.
Uma mulher extremamente criativa, além de se dedicar ao trabalho literário, também foi professora, jornalista e pintora. As suas obras de poesia, tanto para adultos quanto para crianças, se tornaram um sucesso que atravessa gerações.
Confira, abaixo, os 25 poemas mais famosos de Cecília Meireles, para ler e compartilhar com outros apaixonados pelo universo da poesia.
Poemas pequenos de Cecília Meireles
Por vezes a simplicidade pode dizer tudo! Conheça alguns poemas curtos de Cecília Meireles, emocionantes e perfeitos para enviar ou compartilhar:
No mistério do sem-fim
equilibra-se um planeta.
E, no planeta, um jardim,
e, no jardim, um canteiro;
no canteiro uma violeta,
e, sobre ela, o dia inteiro,
entre o planeta e o sem-fim,
a asa de uma borboletaCecília Meireles
Serenata
Permita que eu feche os meus olhos,
pois é muito longe e tão tarde!
Pensei que era apenas demora,
e cantando pus-me a esperar-te.
Permita que agora emudeça:
que me conforme em ser sozinha.
Há uma doce luz no silêncio, e a dor é de origem divina.
Permita que eu volte o meu rosto para um céu maior que este mundo,
e aprenda a ser dócil no sonho como as estrelas no seu rumo.Cecília Meireles
Epigrama n. 2
És precária e veloz, Felicidade.
Custas a vir e, quando vens, não te demoras.
Foste tu que ensinaste aos homens que havia tempo,
e, para te medir, se inventaram as horas.
Felicidade, és coisa estranha e dolorosa:
Fizeste para sempre a vida ficar triste:
Porque um dia se vê que as horas todas passam,
e um tempo despovoado e profundo, persiste.Cecília Meireles
Morro do que há no mundo:
do que vi, do que ouvi.
Morro do que vivi.
Morro comigo, apenas:
com lembranças amadas,
porém desesperadas.
Morro cheia de assombro
por não sentir em mim
nem princípio nem fim.
Morro: e a circunferência
fica, em redor, fechada.
Dentro sou tudo e nada.Cecília Meireles
Fio
No fio da respiração,
rola a minha vida monótona,
rola o peso do meu coração.
Tu não vês o jogo perdendo-se
como as palavras de uma canção.
Passas longe, entre nuvens rápidas,
com tantas estrelas na mão...
— Para que serve o fio trêmulo
em que rola o meu coração?Cecília Meireles
Poemas famosos de Cecília Meireles
Conhecida pelo tom intimista e confessional, Cecília Meireles expressava, através dos seus versos, suas experiências enquanto mulher e poeta.
Refletindo sobre temas intemporais como a identidade e a solidão, a autora continua sendo uma das favoritas entre os leitores contemporâneos.
Lua Adversa
Tenho fases, como a lua.
Fases de andar escondida,
fases de vir para a rua...
Perdição da minha vida!
Perdição da vida minha!
Tenho fases de ser tua,
tenho outras de ser sozinha.
Fases que vão e vêm,
no secreto calendário
que um astrólogo arbitrário
inventou para meu uso.
E roda a melancolia
seu interminável fuso!
Não me encontro com ninguém
(tenho fases como a lua...)
No dia de alguém ser meu
não é dia de eu ser sua...
E, quando chega esse dia,
o outro desapareceu...Cecília Meireles
Retrato
Eu não tinha este rosto de hoje,
Assim calmo, assim triste, assim magro,
Nem estes olhos tão vazios,
Nem o lábio amargo.Eu não tinha estas mãos sem força,
Tão paradas e frias e mortas;
Eu não tinha este coração
Que nem se mostra.Eu não dei por esta mudança,
Tão simples, tão certa, tão fácil:
— Em que espelho ficou perdida
a minha face?Cecília Meireles
Motivo
Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.
Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.
Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
— não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.
Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
— mais nada.Cecília Meireles
Canção
Pus o meu sonho num navio
e o navio em cima do mar;
- depois, abri o mar com as mãos,
para o meu sonho naufragar.
Minhas mãos ainda estão molhadas
do azul das ondas entreabertas,
e a cor que escorre de meus dedos
colore as areias desertas.
O vento vem vindo de longe,
a noite se curva de frio;
debaixo da água vai morrendo
meu sonho, dentro de um navio...
Chorarei quanto for preciso,
para fazer com que o mar cresça,
e o meu navio chegue ao fundo
e o meu sonho desapareça.
Depois, tudo estará perfeito;
praia lisa, águas ordenadas,
meus olhos secos como pedras
e as minhas duas mãos quebradas.Cecília Meireles
Despedida
Por mim, e por vós, e por mais aquilo
que está onde as outras coisas nunca estão,
deixo o mar bravo e o céu tranqüilo:
quero solidão.
Meu caminho é sem marcos nem paisagens.
E como o conheces? - me perguntarão.
- Por não ter palavras, por não ter imagens.
Nenhum inimigo e nenhum irmão.
Que procuras? - Tudo. Que desejas? - Nada.
Viajo sozinha com o meu coração.
Não ando perdida, mas desencontrada.
Levo o meu rumo na minha mão.
A memória voou da minha fronte.
Voou meu amor, minha imaginação...
Talvez eu morra antes do horizonte.
Memória, amor e o resto onde estarão?
Deixo aqui meu corpo, entre o sol e a terra.
(Beijo-te, corpo meu, todo desilusão!
Estandarte triste de uma estranha guerra...)
Quero solidão.Cecília Meireles
Cecília Meireles para crianças: poesias infantis
Com um imaginário divertido, cheio de vida e de lições, Cecília Meireles acabou se tornando uma das mais importantes autoras nacionais de obras infantis.
Através de imagens da natureza ou do próprio cotidiano, a autora conseguia cativar as crianças, transmitindo lições complexas de maneiras simples e gostosas de ler.
Ou isto ou aquilo
Ou se tem chuva e não se tem sol,
ou se tem sol e não se tem chuva!
Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!
Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.
É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo nos dois lugares!
Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,
ou compro o doce e gasto o dinheiro.
Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo…
e vivo escolhendo o dia inteiro!
Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fico tranquilo.
Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo.Cecília Meireles
A bailarina
Esta menina
tão pequenina
quer ser bailarina.
Não conhece nem dó nem ré
mas sabe ficar na ponta do pé.
Não conhece nem mi nem fá
Mas inclina o corpo para cá e para lá
Não conhece nem lá nem si,
mas fecha os olhos e sorri.
Roda, roda, roda, com os bracinhos no ar
e não fica tonta nem sai do lugar.
Põe no cabelo uma estrela e um véu
e diz que caiu do céu.
Esta menina
tão pequenina
quer ser bailarina.
Mas depois esquece todas as danças,
e também quer dormir como as outras crianças.Cecília Meireles
Leilão de jardim
Quem me compra um jardim com flores?
Borboletas de muitas cores,
lavadeiras e passarinhos,
ovos verdes e azuis nos ninhos?Quem me compra este caracol?
Quem me compra um raio de sol?
Um lagarto entre o muro e a hera,
uma estátua da Primavera?Quem me compra este formigueiro?
E este sapo, que é jardineiro?
E a cigarra e a sua canção?
E o grilinho dentro do chão?(Este é o meu leilão.)
Cecília Meireles
O menino azul
O menino quer um burrinho
para passear.
Um burrinho manso,
que não corra nem pule,
mas que saiba conversar.O menino quer um burrinho
que saiba dizer
o nome dos rios,
das montanhas, das flores,
— de tudo o que aparecer.O menino quer um burrinho
que saiba inventar histórias bonitas
com pessoas e bichos
e com barquinhos no mar.E os dois sairão pelo mundo
que é como um jardim
apenas mais largo
e talvez mais comprido
e que não tenha fim.(Quem souber de um burrinho desses,
pode escrever
para a Ruas das Casas,
Número das Portas,
ao Menino Azul que não sabe ler.)Cecília Meireles
Para ir à Lua
Enquanto não têm foguetes
para ir à Lua
os meninos deslizam de patinete
pelas calçadas da rua.Vão cegos de velocidade:
mesmo que quebrem o nariz,
que grande felicidade!
Ser veloz é ser feliz.Ah! se pudessem ser anjos
de longas asas!
Mas são apenas marmanjos.Cecília Meireles
Cecília Meireles: poesias para educação infantil
Enquanto educadora e grande impulsionadora da leitura, Cecília Meireles fazia da poesia infantil um exercício lúdico. Brincando com as palavras e suas sonoridades, os seus poemas despertam a curiosidade das crianças para o mundo da literatura e fomentam a sua paixão pelo conhecimento.
O mosquito escreve
O mosquito pernilongo
trança as pernas, faz um M,
depois, treme, treme, treme,
faz um O bastante oblongo,
faz um S.
O mosquito sobe e desce.
Com artes que ninguém vê,
faz um Q,
faz um U, e faz um I.
Este mosquito
esquisito
cruza as patas, faz um T.E aí,
se arredonda e faz outro O,
mais bonito.Oh!
Já não é analfabeto,
esse inseto,
pois sabe escrever seu nome.Mas depois vai procurar
alguém que possa picar,
pois escrever cansa,
não é, criança?E ele está com muita fome
Cecília Meireles
O Eco
O menino pergunta ao eco
Onde é que ele se esconde.
Mas o eco só responde: Onde? Onde?O menino também lhe pede:
Eco, vem passear comigo!
Mas não sabe se o eco é amigo
ou inimigo.Pois só lhe ouve dizer: Migo!
Cecília Meireles
Tanta tinta
Ah! Menina tonta,
toda suja de tinta
mal o sol desponta!(Sentou-se na ponte,
muito desatenta…
E agora se espanta:
Quem é que a ponte pinta
com tanta tinta?…)A ponte aponta
e se desaponta.
A tontinha tenta
limpar a tinta,
ponto por ponto
e pinta por pinta…
Ah! A menina tonta!
Não viu a tinta da ponte!Cecília Meireles
Sonhos da menina
A flor com que a menina sonha
está no sonho?
ou na fronha?Sonho
risonho:O vento sozinho
no seu carrinho.De que tamanho
seria o rebanho?A vizinha
apanha
a sombrinha
de teia de aranha . . .Na lua há um ninho
de passarinho.A lua com que a menina sonha
é o linho do sonho
ou a lua da fronha?Cecília Meireles
Colar de Carolina
Com seu colar de coral,
Carolina
corre por entre as colunas
da colina.
O colar de Carolina
colore o colo de cal,
torna corada a menina.
E o sol, vendo aquela cor
do colar de Carolina,
põe coroas de coral
nas colunas da colina.Cecília Meireles
Poemas de Cecília Meireles sobre o amor
A autora também escreveu belos poemas de amor, nas suas diversas formas: a paixão, a harmonia, a separação, a saudade...
A Última Cantiga
Num dia que não se advinha,
meus olhos assim estarão:
e há de dizer-se: "Era a expressão
que ela ultimamente tinha."
Sem que se mova a minha mão
nem se incline a minha cabeça
nem a minha boca estremeça
- toda serei recordação.
Meus pensamentos sem tristeza
de novo se debruçarão
entre o acabado coração
e o horizonte da língua presa.
Tu, que foste a minha paixão,
virás a mim, pelo meu gosto,
e de muito além do meu rosto
meus olhos te percorrerão.
Nem por distante ou distraído
escaparás à invocação
que, de amor e de mansidão,
te eleva o meu sonho perdido.
Mas não verás tua existência
nesse mundo sem sol nem chão,
por onde se derramarão
os mares da minha incoerência.
Ainda que sendo tarde e em vão,
perguntarei por que motivo
tudo quanto eu quis de mais vivo
tinha por cima escrito "Não".
E ondas seguidas de saudade,
sempre na tua direção,
caminharão, caminharão,
sem nenhuma finalidade.Cecília Meireles
Interlúdio
As palavras estão muito ditas
e o mundo muito pensado.
Fico ao teu lado.
Não me digas que há futuro
nem passado.
Deixa o presente — claro muro
sem coisas escritas.
Deixa o presente. Não fales,
Não me expliques o presente,
pois é tudo demasiado.
Em águas de eternamente,
o cometa dos meus males
afunda, desarvorado.
Fico ao teu lado.Cecília Meireles
Reinvenção
A vida só é possível
reinventada.
Anda o sol pelas campinas
e passeia a mão dourada
pelas águas, pelas folhas...
Ah! tudo bolhas
que vem de fundas piscinas
de ilusionismo... — mais nada.
Mas a vida, a vida, a vida,
a vida só é possível
reinventada.
Vem a lua, vem, retira
as algemas dos meus braços.
Projeto-me por espaços
cheios da tua Figura.
Tudo mentira! Mentira
da lua, na noite escura.
Não te encontro, não te alcanço...
Só — no tempo equilibrada,
desprendo-me do balanço
que além do tempo me leva.
Só — na treva,
fico: recebida e dada.
Porque a vida, a vida, a vida,
a vida só é possível
reinventada.Cecília Meireles
Timidez
Basta-me um pequeno gesto,
feito de longe e de leve,
para que venhas comigo
e eu para sempre te leve...
- mas só esse eu não farei.
Uma palavra caída
das montanhas dos instantes
desmancha todos os mares
e une as terras distantes...
- palavras que não direi.
Para que tu me adivinhes,
entre os ventos taciturnos,
apago meus pensamentos,
ponho vestidos noturnos,
- que amargamente inventei.
E, enquanto não me descobres,
os mundos vão navegando
nos ares certos do tempo,
até não se sabe quando...
- e um dia me acabarei.Cecília Meireles
Nunca eu tivera querido
dizer palavra tão louca:
bateu-me o vento na boca,
e depois no teu ouvido.
Levou somente palavra,
deixou ficar o sentido.
O sentido está guardado
no rosto com que te miro,
neste perdido suspiro
que te segue alucinado,
no meu sorriso suspenso
como um beijo malogrado.
Nunca ninguém viu ninguém
que o amor pusesse tão triste.
Essa tristeza não viste,
e eu sei que ela se vê bem...
Só se aquele mesmo vento
fechou os teus olhos também...Cecília Meireles