Literatura de Cordel
Contar histórias é uma paisagem e a tragédia é comédia e drama. Depende simplesmente de como você enquadra o que está vendo.
Não comece a escrever sem saber aonde ir. Em um bom conto, as três primeiras linhas têm quase a mesma importância que as três últimas.
Dia incomum. Dia de acontecer viagem. E acontece na leveza das ausências de pressa, bem vagarosa. Estrada de asfalto afora. Menino dorme, acorda, conversa - mais interrogações, que fala! Observa calado - olhos gigantes e atentos - tudo o que se passa. Estrada não acaba. Paciência se esgota! "Quantos quilômetros ainda, mamãe?" Ciranda de sonos e interrogações sem fim. Estrada se estreita.
Primeira parada. Máscaras nas laterais das portas do carro. Não pode esquecer. Tá no rosto. Inibindo o sorriso - não a vontade de correr pelo parquinho, pular no pula-pula, aproveitar minuto de parada e fazer o que toda criança ama: brincar. Fotos pra cá, pra lá, café e....estrada novamente. Alguns metros percorridos, corpo ainda acomodando nos bancos, e... sem ao menos se ajeitar: "olha lá o Chaves!" - mãe exclama quase quando carro se adianta! E assim nasce encontro entre Poeta e Poesia. Foi ontem. O Chaves.
"Uma escultura gigante do Chaves, imortalizado pelo ator mexicano Roberto Gómez Bolaños, deu graça e cor a paisagem cinza da BR-381 em Governador Valadares, no Leste do Estado. Sentado sobre um caixote, com mãos no queixo e olhar voltado para o KM 159 da rodovia, o menino travesso pode ser reconhecido de longe" - assim diz texto de internet.
A criação foi em 2015, e o Poeta, por motivos vários, nunca conseguiu visitá-la.
Sem ansiedades. De longe, admirava escultura enquanto carro abastecia. Quase num ritual...olhava, pensava como seriam as fotos. E lá estava, sonho simples e demorado... tão perto!
Seguir também é ficar. E algo permaneceu alí, na escultura. Registro não só de imagens. Na certeza de que tempo muitas vezes é só decisão. De parar...ver e seguir. E pensamento não perdoa memórias - bailavam na cabeça, estrada afora, entre intervalo do sono de menino e de mãe também.
É saudade das moradas infantis carregadas de memória...de uma geração onde a poesia estava nos pés descalços e nas brincadeiras de rua, longe do imediatismo das tecnologias... onde criança era criança sem querer saber do mundo, pois mundo era a própria imaginação. Saudades infantis pra serem lembradas e partilhadas...
Que a infância não morra em nós. Pra que nossos pequenos possam ter a ternura da infância com sua leveza.
Gratidão, Chaves. Gratidão, Bolaños.
Gratidão Faisal Homaidam e Evandro Caetano.
Gratidão por não morrer no Poeta a criança que um dia foi.
À todas as crianças que são crianças e àqueles que decidem nunca deixar de ser!
O Farol
Quem vem lá novamente?
Marinheiro, sereia ou mais um barco trazido pela corrente?
Aos que veem minha luz, um alerta:
- Te aviso, te aconselho.
Mas só tu podes tomar a escolha certa.
Aos marujos que ao acaso me encontram, abrem todos um largo sorriso
- Terra à vista! – Todos gritam – Não há mais perigo!
Se usam de minha luz e minha orientação, para desembarcarem felizes agradecendo a Deus pelo fim da escuridão.
Logo, um por um vem até mim:
- Santo Farol! Das trevas nos tirou.
A muito perdidos nas brumas e breu, só tu nos guiou.
Tua luz, vimos todos de longe
Sentimos o teu calor.
- Achei que estava perdido
- Achei que nunca foste te achar, tu és o mais belo farol a brilhar!
- Nos acolha nesta terra tua, imploramos!
Nos ensine teus segredos, nos mostre os seus encantos!
Apesar de marinheiros eloquentes,
Temos por ti um amor agora eminente.
Nunca vimos nada maior, tão lindo à luz do sol,
Apenas tu, Santo Farol!
Com todo amor e felicidade me emociono,
Fui assim tão procurado, finalmente encontrado.
Estaria eu em um sonho?
Nascia de novo um sentimento enfim.
Há de ser calor?
Há de ser amor?
Há de ser pra mim?
Olhei-os e vos acolhi em minha morada,
A eles ensinei o segredo das terras, das estrelas e das alvoradas.
Contei-lhes histórias de terras distantes, reis dominantes e seres falantes.
E via o brilho no olhar de cada navegante.
Via crescer o universo dentro de cada marujo
E me sentia mais vivo por poder cativar e dar-lhes refúgio.
A mim, toda noite, eles agradeciam:
- obrigado Santo Farol, tu ainda nos guia.
Eis que então decido mudar,
E se for esse meu destino com eles, e apenas nosso futuro iluminar?
Na calmaria então eu decido, desligo a luz que ilumina a tudo.
Agora eu foco apenas no nosso novo mundo.
Dirijo a luz voltada para frente,
Sem mais deixá-la rodar procurando por nenhum outro inconsequente.
Segue assim uma vasta paz,
Eu sorrio sereno,
Apenas iluminando o futuro terreno.
Então, as luas vêm e se vão.
E o mar que outrora estava quieto torna a gritar,
E gritam também os marinheiros,
Se arrumando para zarpar.
Em pânico ofego:
- Já se vão? Mal chegastes!
Fiquem, por favor, o que findou o seu quedaste?
E aos risos todos me disseram:
- Ó tolo Farol, o que esperavas?
Fazermos de vós nossa nova morada?
De luz nós não vivemos,
Sabedoria e destino traçado, agora todos temos.
De que nos vale tu agora?
Tolo Farol!
Partiremos desbravando o imenso azul que tanto nos ensinaste avidamente,
Agora sabendo que dessa vez não nos perderemos novamente.
Aos risos e cantos assim se arrumaram,
Saudosos, esperançosos e novo destino rumaram.
O sentimento que outrora se fez infinito,
Partia mais uma vez rumo ao seu novo destino.
Se fosse o Farol de carne e osso,
Ali teria morrido,
Doeu-lhe mais uma vez a dor de um coração partido.
Não entendia nada daquilo,
Como um amor assim tão grande poderia ter sumido?
Fui eu que errei? – Perguntei-me
Foi minha luz que muito longe foquei?
Foram os dias e noites de dedicação que por eles acalentei?
Ó que tristeza por ser um farol.
Eis me aqui imponente,
Com a luz que tudo guia,
Com inteligência e sabedoria,
Para ser assim deixado à esmo, em caos, perdida?
Nada me resta se não voltar iluminar as trevas mais uma vez.
Jogando o brilho da luz no vazio, para me esquecer de mais essa estupidez.
E pelo ciclo ingênuo de minha vida,
Atrairei novos perdidos à deriva,
Cegos e iludidos por essa luz que tanto brilha,
E eu inocente, serei novamente seu guia.
Mas e se o farol um dia se apagar?
Será que os ingratos a mim vão procurar?
O Farol sente
O Farol sabe
O Farol chora
E o mesmo Farol também se perdeu,
Em meio a luz, que tantos fez feliz outrora.
A arte literária nutre o indivíduo, une nações e se comunica com seus leitores de inúmeras maneiras. Consumir literatura leva o leitor a lugares incríveis, mostra o mundo através de várias perspectivas e jamais deixa o indivíduo em inércia.
O romance LUZIA-HOMEM
Despertou papel profundo,
No regionalismo nordestino,
Influência marcante do mundo.
Uma obra naturalista,
Pesquisou Freud Sigmund.
Transformando
Por onde andei
Era chão atapetado
Não havia ruído
Mas o corroído da alma
Era mais barulhento
Por onde andei
Palavras sussurradas
Pois não há suturas
Para emendar
Sonhos impossíveis
Por onde andei
Vaguei
Fui tateando
E o impossível
Se despiu
Por onde andei
A poesia tingiu
E fugiu
Por onde andei
Fui sobrevivente
De minhas escolhas
E da minha coragem
Por onde andei
Minha voz
Virou você
Um barco de estações escritas
Com seu nome
Que naufragou
Por onde andei
Na vida
Resisti, escapei
Me salvei
De mim mesma
Das horas
De lagarta
Nas horas de borboleta.
Livro: Pó de Anjo
Outono
Chegaste ao outono
Da vida.
Na primavera me mostraste
Os campos de
Teu perfume.
Abandonaste-me no inverno
E meu coração
Congelou.
Restou o mapa de sua nação
De nossas intenções
Tatuado
Maculado em meus seios.
Hoje sou lagarta
Sem verão
À procura de seu coração
Para
Fazer
Transformação.
Chegaste ao outono da vida
Mostraste-me a primavera
Nos campos de teu perfume
Abandonaste no inverno de incertezas
Meu coração, este inverno.
Inferno congelado
Não acha o verão.
Chegaste ao outono da vida
Mostraste-me
Na primavera
Os campos de seu perfume
Um território que eu desconhecia.
Livro Pó de Anjo
Autora: Rosana Fleury
Adverso
Em cada verso
Em cada verso
Que escrevo
Você existe
Em cada página
Que viro
Você permanece
Em cada lágrima
Que corre
Você escorre
Em cada sopro
Do vento
Que bate em
Meu rosto
Você se reinventa e
Reescreve
Em cada vírgula
Que para, pausa
Você resiste
Em cada dia
Que apaga
Você afaga em
Lembranças
Em cada soluço
Que tropeço
Você navega
Nas lágrimas
Em cada palavra
Que escrevo
Você finge e corre
Em cada rima
Que descrevo
Você é o fim
Em cada final
Que você existe
Eu fico
Feliz
Escorre
Delicadamente
Em cada dia que amanhece
Assim
Eu adereço
O seu jeito de ser
Em cada tempero
Que eu verso
Você compõe
Em cada perfume
Em que fico
Você se banha
E o passado
Permanece
Inalterável
Como presença
Peço ao tempo imperar
Transmutação
Até virar
Dia pó
Areia
Pós dia
Poeira
Sujeira
De um verso
Do avesso
Exausto
De ser
Execrável
Cafajeste
De rimar
Ordinário
Em cada tormento
Que me afronta
Eu escrevo
Rimo
Componho
Crucificação com
Libertação
Alforriado
Em paz
Livro Pó de Anjo
Autora: Rosana Fleury
Vazio
Não há nada
Somente vazio
Um copo sem fundo
Um corpo que quer vida
Não há verbos
Para decifrar
A cegueira
De nossos movimentos
Não há dicionário
Para encapar
Os meus,
O seu,
Os nossos
Sentimentos
Não há energia
Nem transcendência do viver
Não há nada
No olhar
Não sobrou coisa nenhuma
Mas há
Você navegando
Em mim.
Livro Pó de Anjo
Autora: Rosana Fleury
Frio
Frio
Adivinha minha alma
Percorra
Sinta
Perceba
A saudade
Frio
Fale
Amargue
Congele
Apague
Tudo
Frio
Endureça
A minha vontade
Congele
Meus dedos
Vire pedra
Para que
Eu nunca
Atire no destino
A quem interessar
Congelou
Minha alma
Frio
Abrace-me
Necrose
Apodreça
Para que nada aconteça
Frio
Não me leve
Não me enterre
Não me deixe
Quero
Arrepiar
Não só de frio
Mas de
Clamor
De um frio absoluto
De amar.
Livro Pó de Anjo
Autora: Rosana Fleury
De que lugar
Onde anda você?
Em que parágrafo você acorda?
Em que capítulo você se despe?
Com que asas você voa?
Em que céus devo te procurar?
Em que estação você floresce?
Em que águas devo te recolher?
Qual o recado que vai enviar?
Em que nuvem vai escrever.....
Livro Pó de Anjo
Autora: Rosana Fleury
O Tapa
Ele pertencia a alguma tribo.
Havia nascido mirrado, moreno, gritava feito indomado e era de gênio irascível.
Donde surgiu isto?
Criatura tão imprevisível, veio ao mundo onde todos só desejavam o aprazível.
Ele era tenente, contente e soberbo, dono de si mesmo.
Era do mundo.
A mãe gritava,
Se irritava.
E ele não se alterava.
Até que um dia...
Sem data...
Sem tempo...
A paciência navegou e naufragou na violência, e a mãe deu um tapa na cara do herdeiro, vomitando sua raiva com raça, na face da criança que ela mesma gerou!
Mas... o pescoço dele virou e ficou assim errado, de
cara virada, nas costas, vendo o mundo afastado.
A mãe gritou e se apavorou e não houve ciência e cientista
que desvirasse o virado.
E ele se criou, num mundo onde ele próprio assistia às aulas de pescoço virado, nas costas.
Mas tirou vantagem!
A mãe tinha trabalho.
Tudo de costas, num mundo que só conta as horas prá frente.
Tinha bom ouvido, porque os olhos nos traem, o olfato nos engana e a verve nos veste de lama mas, ele ganhou na percepção.
O menino, agora homem, cresceu, se profissionalizou e arrasou em tudo.
Até nas conquistas!
Mas, de costas?
Sim de costas.
Como?
Foi assim: ela passou, ele de pescoço virado ignorou; ela se virou e piscou e ele se apaixonou!
Se casaram de data marcada, convite confirmado, com balada ensaiada e festa preparada.
Mas. como seria a entrada?
Ele de costas para a nave central, onde o padre ministrava os sacramentos?
Ela o amava e resolveu:
Vou entrar com ele de cara virada, de braço dado.
Ninguém perdeu!
A Igreja encheu.
Ela desceu do carro, frente aos curiosos,
Feliz!!!
No patamar, à porta, ele a esperava, de pescoço virado.
Ela na certeza de que o amava...
...o beijou... e o pescoço d’ele, desvirou.
O trauma estancou e ela mais se encantou!
E entraram assim:
Ela, elegante, e ele de pescoço desvirado, na grande mágica que o AMOR faz na vida.
Livro: Não Cortem Meus Cabelos
Autora: Rosana Fleury
Índice Poético
Meu Deus,
Me perdoe
Porque o vinho que bebi em dezenas
Me deu um tapa
E pela madrugada
Em metamorfose
Eu vi o corredor
E entrei nele de cabelos longos
E o dragão que habitava nele
Chamuscou meus fios
E eu
Em transformação
Fui à vidente
Para decifrar as linhas
E ela nada me disse
E virei vatapá
Mistura
E no compasso de tudo
Num vôo sem direção
Eu fiquei envidraçada
E a partir de um todo
A verdade
Se perdeu
Em uma história sem fim,
Dentro de uma taça
Onde escorre a vida
E tudo é
Refluxo
Do que vivemos.
Livro: Não Cortem Meus Cabelos
Autora: Rosana Fleury
"Ninguém aprende ser escritor. Ou você é ou não é.
Ser escritor é encontrar conforto e amparo nas palavras, é ter o tudo e não ter nada, porque aquilo que tens quer compartilhar. E acabas ficando rico de sabedoria. Que nunca falte literatura aos homens."
Eu preciso dizer o que sinto e penso de alguma forma - é um alívio! Mas o esforço está ficando maior que o alívio.
Se existe algo que eu posso afirmar e que jamais poderão dizer ou usar contra mim é que eu nunca julguei, nem jamais vou julgar um escritor pelo que ele escreve, o gênero literário que ele escreve, o tema que ele escreve. A não ser algo que desrespeite ou faça apologia ao desrespeito dos direitos humanos... Pois não dá para concordar com isso.
Cada um escreve o que quiser.