Limpar a Casa
Amar alguém é como se mudar para uma outra casa. No começo a gente se apaixona por todas as coisas novas, a gente se pergunta toda manhã se aquilo é nosso de fato, como se tivesse medo de que alguém de repente entrasse correndo pela porta e reclamasse que tinha havido um grande engano, e que não era de jeito nenhum seu direito morar num lugar tão lindo. Mas com o passar dos anos a fachada da casa fica gasta, a madeira racha aqui e ali, e a gente começa a amar esse lugar não tanto porque ele nos parece perfeito, mas por todas as suas imperfeições. A gente fica conhecendo todos os detalhes dessa casa. Por exemplo, como evitar que a chave emperre na fechadura na época de frio. Quais placas do chão cedem um pouquinho quando se pisa nelas, e como se deve abrir as portas dos armários para elas não rangerem. E é isso, são exatamente todos os pequenos segredos que fazem desta a sua casa.
Uma família simples constrói sua casa pensando na quantidade de filhos e netos que vai ter. A Igreja deveria pensar da mesma forma.
ENTRE LINHAS
Aquele olhar insensante
de olhos penetrantes
não sei se verdes, não sei se mel
Mas sei que quando olho, acalma pois me sinto no céu.
Aquela voz grave
Um som que pertuba a mente e ao mesmo tempo acalma a alma.
A palavra CALMA ecoa em meus ouvidos, talvez de tanto ouvir sua doce voz nos meus dias agitados
Cantarola lindas canções que alegra meu coração, afirmo e concordo que bom gosto.
Aquele abraço casa
Me parece até clichê escrever sobre isso, mas é verídico.
Sua altura tão proporcional ao abraço me faz escutar suas batidas, assim transmitindo sua energia.
Abraço esse que arranca muitas palavras no silêncio.
Suas mãos,, ah suas mãos...
Que tanto já passearam meu corpo em pensamento, desde o pescoço até a ponta do pé.
Deslizaram pois como num violão que este tú dominas.
Suas mãos grandes e fortes transmitem proteção e cuidado.
Ah, passaria por várias linhas e falaria de cada detalhe seu.
Mas como pode ter tanto a falar sem ao menos estar perto.
Eu te digo que por trás da tela do celular, fones de ouvido e uma boa imaginação, já vivemos muito.
A CASA
É um chalé com alpendre, forrado de hera. Na sala, tem uma gravura de Natal com neve. Não tem lugar pra esta casa em ruas que se conhecem. Mas afirmo que tem janelas, claridade de lâmpada atravessando o vidro, um noivo que ronda a casa — esta que parece sombria — e uma noiva lá dentro que sou eu. É uma casa de esquina, indestrutível. Moro nela quando lembro, quando quero acendo o fogo, as torneiras jorram, eu fico esperando o noivo, na minha casa aquecida. Não fica em bairro esta casa infensa à demolição. Fica num modo tristonho de certos entardeceres, quando o que um corpo deseja é outro corpo pra escavar. Uma ideia de exílio e túnel.
(Extraído do livro em PDF: O coração disparado [recurso eletrônico] / Adélia Prado. - 1. ed. - Rio de Janeiro: Record, 2013. recurso digital – Página 10)
“ Prefiro mil vezes compartilhar uma casa com mosquitos sugando meu sangue ; do que compartilhar uma casa com invejosos sugando minha alma .”
Tal qual a casa construída sobre a rocha, ao coração edificado na fé nenhuma intempérie poderá jamais destruí-lo.
Casa da Vovó
Minha avó era exatamente o que se esperam de uma avó, bem tradicional. Cabelos totalmente brancos, ancas largas e usava avental. A casa dela tinha tudo o que não tinha na minha casa, nem nas casas das minhas tias, sei lá, era só um lote típico da grande BHte dos anos setenta. Trezentos e sessenta metros de área, mas tinha tanta árvore frutífera que parecia uma chácara fincada na Cidade Industrial. Manga Ubá, cana, figo, uva, abacate, pitanga, limão, laranja, frutas e mais frutas que davam o ano inteiro. Cada fruta em seu tempo próprio faziam o lote ser um paraíso para mim, meus irmãos e meus primos.
Minha avó jamais brigava conosco quando nossos brinquedos eram suas coleções de moedas antigas, ou os trotes ao telefone que só lá tinha. Quando eu estava lá sozinho, brincava com os cães do meu tio ou me estirava no sofá que parecia tão gigante na frente da TV. O café da minha tia... Humm que delícia de café!
Minha mãe se tornou avó como minha avó. Cabelos brancos, ancas largas e eventualmente um avental. Um "fubá suado" como nunca mais experimentei. Ver meus filhos e meus sobrinhos brincando pela casa, subindo na laje, descendo o morrinho do portão, voltando em bando para comer o bolinho de chuva com recheio especial... Ontem fez um mês que elas se reencontraram na casa nova...
Um dia sem Você é como a morte pra mim
Pois só sei viver com Você aqui
Porque com Você, então, eu posso ser
Vem aqui
E faça do meu quarto o Seu quarto também
E do meu coração uma casa pra Você
Toma minha chave, não precisa fazer cópia
Dou ela pra Você
É primeiro de janeiro e lembro disso por causa do passeio que fizemos de manhã. Dormi na tua casa. Nesse dia ainda chamo tua casa de tua casa embora saiba que vá virar nossa casa logo depois. Essa, a que vai, não hoje, eu aqui escrevendo, mas a qualquer momento, virar tua casa outra vez.
O que eu vou levar pra minha casa
Depois de passado meu tempo, quando na lista infindável dos dias impressos no calendário já não houver junhos para mim, de volta pra casa vou levar sem arrependimentos:
Muitos sorrisos que dei. Algumas risadas esparramadas nas conversas com minha mãe; detalhes do olhar que meu pai tinha sobre tudo; os laços que tenho atados aos meus irmãos; muitas músicas; a surpresa diante de qualquer pássaro. Diante de qualquer beleza que voa; o silêncio diante das belezas – que sempre foram minhas mais indescritíveis preces.
Vou levar alguns sábados à tarde, e algumas sextas-feiras inesquecíveis. E a lua.
Vou levar muitos textos que amei; as cores das flores e do céu. Vou levar pedaços bem grandes dos outonos e suas luzes mágicas. Vou levar meus amigos, tios e tias, primos e primas e minhas histórias de infância. Vou levar meu amor incondicional pelas árvores e pelo que há de mais pequeno e verde. Vou levar as pequeninas flores do campo e sua singeleza coberta de manhãs.
Vou levar minhas meninas margaridas, porque sem elas nenhum lugar será completo. Vou levar o que tenho sido e o que não consegui ser. Vou levar meus meninos – a filha e o filho que criei. Vou levar o barulho das águas que habitam o mundo das mais variadas formas até chegarem ao lugar em que, juntas, se chamam mar.
E do mar vou levar o cheiro. E vou levar as palavras, porque sem elas não há salvação.
Vou entregá-las a Deus e deixar que Ele escreva em mim o último, o derradeiro, o mais perfeito poema.
E que, assim, eu possa ver a verdade – que a morte é simplesmente o jeito que Deus tem de nos fazer poesia.