Habito da Leitura
O homem inventou a igualdade.
Na natureza tudo é desigual.
A perfeição é invenção geométrica.
A ordem do mundo é o caos mutante.
A criação é sempre nova:
só acontece uma vez.
Se você aprender a ver
nunca mais dirá que o mundo
é o mesmo o tempo todo.
Da janela do presente
observa-se o presente
com os olhos do passado.
Da janela do presente
observa-sse o futuro
como extensão do passado.
Quando somos o presente,
não há futuro e passado,
porque só há o presente
observando o presente.
O tempo vazio.
O espaço vazio.
O coração vazio.
Um oco que não tem fim.
A solidão sem fronteiras.
Um silêncio surdo-mudo
é testemunha do nada.
O futuro é o próximo ato,
o próximo passo,
o próximo fato.
Ele existe enquanto não existe
e morre logo que se torna hoje.
O real nos parece um fluxo e no fluxo não há modelos. Daí, a eterna controvérsia dos que admitem, como Heráclito, que o fluxo ou devir é a realidade e dos que entendem, como Parmênides, que o real é imutável e o devir é aparência. Os modelos, portanto, são nossas formas perceptuais e transitórias de apreender, a cada momento, o fluxo. Assim, cada forma perceptual do fluxo só é real em relação ao percebedor no momento da percepção e só se torna aparência ou Maya se prossegue além da percepção.
O real é o agora. O agora é sempre inédito. Quem vê, não precisa de palavras, pois só se fala para aqueles que não viram. E o que se diz, já não é: o presente é mais rápido que o laço da palavra. Por isso, quem fala, não vê, porque, se fala, fala do que já não vê. O eu não existe no presente: surge, quando a experiência já terminou. O eu é o passado.
Cada percepção do real é única e irrepetível. Jamais saberemos o que perdemos, ja-
mais repetiremos o que experimentamos. A riqueza do viver não consiste na acumulação do vivido, mas na capacidade de viver plenamente o momento que passa. Nenhuma experiência deve deixar restos ou saldos, pois eles deformam as novas percepções da realidade.
Cada vez mais se constata que a atividade psíquica não é um produto exclusivamente fisiológico. Sabe-se, experimentalmente, que a ausência da atividade onírica provoca estados psicóticos, os quais, inclusive, podem levar é morte, caso persistam por muito tempo. A importância da vida mental para o organismo ficou comprovada nesses experimentos.
O homem, quando dorme, apenas muda o nível de sua atividade psíquica. Se o que ele percebe, em estado de vigília, é real, por que real seria o que ele percebe oniricamente?
Qual, na verdade, a diferença entre o que passou e o sonho? A memória não prova o que aconteceu, pois o presente, agindo sobre o passado, o modifica. Só o presente, então, parece real. Mas, o presente é instantâneo e está influenciado pela memória e pelas expectativas do futuro.
O sonho é o que não se tornou fato e o passado é o fato que se tornou sonho, pois a memória tem a mesma estrutura do sonho.
A dúvida é a ginástica da inteligência.
Duvidar não é apenas negar o que existe, mas negar que o que existe seja a única coisa que existe. Negar, assim, é ampliar a visão da realidade. A dúvida que apenas nega é destrutiva.
O dogma é o cansaço da razão.
O homem que não duvida, cansou de crescer.
A dúvida é a saúde do espirito. Duvida-se, porque se quer mais. Porque se sabe que o que se sabe é provisoriamente necessário e necessariamente provisório. Porque o saber não tem fim. E o provisório não é irreal, enquanto provisório.
A dúvida é a fé de que há algo mais além do que se crê e a fé é a dúvida de que todo
real é só o que conhecemos.
Aonde vai quem morreu,
quando o seu onde perdeu?
Onde está quem não está
seja aqui ou seja lá?
Se o quem se fez invisível,
agora é carne impossível,
sem onde e quando, desfeito
no nada de que foi feito.
Você observa minha maneira de sorrir pra tudo e pra todos como se eu fosse uma desesperada. Fica ali, parado, tentando achar explicações para os meus risos como se eu não tivesse motivo para sorrir. Sempre me observando... Tentando separar as coisas boas e ruins de mim. E quando decidi se aproximar - chegar perto a ponto de tocar - sussurra em meu ouvido pedindo para eu mudar: arranjando desculpas para que eu anule meus erros. Pedi com tamanha facilidade que eu os arranque de mim, mesmo deixando bem claro que ficarei incompleta. Arranja mil maneiras de conserto como se eu fosse um brinquedo, quebrado, a ponto de ir para o lixo. E sei que você não conserta a boneca velha e usada para brincar: você a doa para qualquer um como se ela não tivesse sentimento. Oras, são apenas retalhos.
Ouça mais uma vez, boy. Não sou perfeita e te avisei desde o início, antes mesmo de você me iludir com esse falso amor. A minha perfeição está no quanto imperfeita sou: as coisas que você gosta mais as que te repelem de mim. E precisaria ser um tanto estranha para que eu consiga separar as coisas boas das ruins, entende? Não, você não me entende. Não vê? Se eu for certinha você enjoará de mim e procurará outra garota idêntica a que fui. Faz parte do seu ciclo. Isso vai. Isso volta. Isso nunca pára. Isso se repete meu bem. O ciclo tem formato de circunferência, vê se aprende. Não tem começo... Nem fim.
Então me deixe em paz por um minuto. Deixa em paz meu coração. Deixa em paz a mim! PazCoração: deve haver algum sentido, talvez. Deixa-me andar por essas ruas desertas e gritar tão alto e agudo que possa entontecer as pessoas, mesmo que elas ou você grite: louca! Dai-me a liberdade de ser eu já que aceito você sendo você. Escuta boy: “eu te deixo ser, deixa-me ser então.”
Já que gostas tanto de observar, te darei tempo suficiente para isso. Observe e enlouqueça. Enlouqueça e observe. Esqueça a ordem cronológica boy, é perda de tempo. Vou entrar num processo estonteante de amnésia. Permita-me que eu encha meus pulmões de ar e solte-o desesperadamente a fim de esvaziar-me de ti, esvaziar-me de mim. Esvaziar.
Você conseguiu boy, agora agüenta! E eu bem que te avisei. Esvaziei-me tanto que não restou nada dentro de mim, agora: só vácuo. A correnteza de ar que saiu no processo de esvaziamento levou junto tudo o que sentia, sentia por ti. Agora... Trate de arranjar outra boneca para consertar; essa aqui já foi para o lixo e você fez o favor de ajudar na decomposição, seu verme! Mais rápido, por favor, antes que você fique tão só; se sinta tão vazio; e me culpe por isso. Antes que você sinta uma dor profunda como se alguém lhe arrancasse a alma e lágrimas caiam de saudade. Embora minha vontade fosse essa, eu não a quero. E principalmente, antes de você cair na real e pensar: realmente ela era uma desesperada. Louca, talvez. Mas uma desesperadalouca por mim.
E eu não agüentaria ver suas lágrimas escorrerem pelo rosto encharcando sua roupa. Eu não agüentaria ver você arrependido. Sentiria náuseas e uma louca vontade de beber um porre de conhaque acreditando que esqueceria tudo no dia seguinte, mas isso nem sempre acontece. Ah, a realidade é que: te ver sofrer doeria mais em mim do que em você e eu não suportaria tamanha dor.
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