Gerando um Filho
O Pai Rico
O filho de um homem muito rico foi encarregado de gerenciar uma de suas empresas. Certa vez, ele pegou todo o lucro do mês e foi jogar cartas, perdendo tudo no jogo, sendo apontado por seus irmãos como irresponsável e inconsequente, merecendo, portanto, ser até deserdado.
Mas o pai, olhando para seu filho querido, não hesitou em dar-lhe de volta tudo quanto ele tinha perdido e mais um pouco de dinheiro, dizendo-lhe: vai, meu filho, e reconstrói o que tu destruistes.
Intrigados, os demais filhos foram questionar ao pai sobre sua forma de agir. Então aquele homem explicou que estava bastante chateado com o que tinha acontecido,sim. Mas devia reconhecer que seu filho tinha pecado pela ousadia, apenas isto. Se ele tivesse ganhado dinheiro no jogo, a esta hora estaríamos todos comemorando, e provavelmente sendo beneficiados por isto.
Aquele filho precisava apenas de um pouco mais de prudência, mas ele não poderia punir sua coragem e ousadia, pois assim como ele perdeu, ele poderia ter ganhado.
A Oração de Maria
Deus. Ó Deus infante. O mais precioso filho do céu. Concebido pela união da graça divina com a nossa desgraça. Durma bem.
Durma bem. Banhado pela fresca da noite cravejada de diamantes. Durma bem, pois o fogo da ira ferve bem perto. Goze do silêncio do berço, pois o ruído do tumulto se faz sentir em seu futuro. Saboreie a doce segurança de meus braços, pois chegará breve o dia em que não poderei protegê-lo.
Descansem bem, mãos pequeninas. Pois apesar de pertencerem a um rei, vocês não tocarão o cetim, não possuirão ouro. Não pegarão numa pena, não guiarão um pincel. Não, suas mãos pequeninas foram reservadas para obras mais preciosas:
tocar a chaga viva de um leproso
enxugar a lágrima triste de uma viúva,
agarrar-se ao chão do Getsêmani.
Suas mãos, tão minúsculas, tão ternas, tão brancas — fechadas hoje em forma de punho infantil. Elas não foram destinadas a empunhar um cetro nem abanar do balcão de um palácio, mas reservadas para o cravo romano que irá pregá-las numa cruz romana.
Durmam bem, olhos pequeninos. Durmam enquanto podem. Pois logo virá a claridade e você vai ver a confusão que fizemos do seu mundo.
Verá nossa nudez, pois não podemos ocultar-nos.
Verá nosso egoísmo, pois não podemos dar.
Verá nossa dor, pois não podemos curar.
Ó olhos que verão o abismo escuro e seu terrível príncipe... durmam, por favor, durmam; durmam enquanto podem.
Fique quieta, boquinha pequenina. Fique quieta boca pela qual falará a eternidade.
Língua minúscula que em breve chamará os mortos,
que irá definir a graça,
que silenciará nossa insensatez.
Lábios de botão — sobre os quais paira um beijo de estrelas concedendo perdão para os que crerem em você, e de morte para os que o negarem — fiquem quietos.
Pezinhos pequeninos que cabem na palma de minha mão, descansem. Pois passos difíceis estão à sua frente.
Sentem o cheiro do pó das estradas que terão de palmilhar?
Sentem a água fria e salgada sobre as quais andarão? Recuam ao sentir o prego que terão de suportar? Temem a descida íngreme pela escada em espiral até o domínio de Satanás?
Descansem, pezinhos pequeninos. Descansem hoje para que amanhã possam andar com poder. Descansem. Pois milhares irão seguir os seus passos.
Pequeno coração... coração santo... bombeando o sangue da vida através do universo: quantas vezes iremos quebrantá-lo?
Você será dilacerado pelos espinhos de nossas acusações.
Você será devastado pelo câncer do nosso pecado.
Você será esmagado pelo peso de sua própria tristeza.
E será traspassado pela lança da nossa rejeição.
Todavia nesse ato de traspassar, nesse último rompimento de músculo e membrana, nessa precipitação final de sangue e água, Ele irá encontrar descanso. Suas mãos serão libertadas, Seus olhos verão a justiça, Seus lábios sorrirão, e Seus pés o levarão para casa.
E ali descansará de novo — desta vez nos braços do Pai.
Criar uma criança é fácil, basta satisfazer-lhe as vontades. Educar é trabalhoso.
SONETO
O quanto perco em luz conquisto em sombra.
E é de recusa ao sol que me sustento.
Às estrelas, prefiro o que se esconde
Nos crepúsculos graves dos conventos.
Humildemente envolvo-me na sombra
que veste, à noite, os cegos monumentos
isolados nas praças esquecidas
e vazios de luz e movimento.
Não sei se entendes: em teus olhos nasce
a noite côncava e profunda, enquanto
clara manhã revive em tua face.
Daí amar teus olhos mais que o corpo
com esse escuro e amargo desespero
com que haverei de amar depois de morto.
Para Fazer um Soneto
Tome um pouco de azul, se a tarde é clara,
e espere um instante ocasional
neste curto intervalo Deus prepara
e lhe oferta a palavra inicial
Ai, adote uma atitude avara
se você preferir a cor local
não use mais que o sol da sua cara
e um pedaço de fundo de quintal
Se não procure o cinza e esta vagueza
das lembranças da infância, e não se apresse
antes, deixe levá-lo a correnteza
Mas ao chegar ao ponto em que se tece
dentro da escuridão a vã certeza
ponha tudo de lado e então comece.
Uma boa mãe dá ao enteado um pedaço de bolo igual ao que dá ao próprio filho, mas fá-lo de maneira diferente.
A dúvida é uma doença. Contamina a mente, gerando desconfiança dos motivos alheios e das próprias percepções. A dúvida tem a habilidade de questionar tudo o que você já acreditou sobre alguém. E de reforçar as suspeitas mais sombrias ao nosso redor.
(Emily Thorne)
Eu tecerei uns sonhos irreais... Como essa mãe que viu o filho partir; como esse filho que não voltou mais!
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