Eram pobres para os luxos maiores da... Pâmela Martini
Eram pobres para os luxos maiores da vida e sabia que a idade lhes fazia mal. Viviam a si próprios o paraíso da pele, mapeando curvas e vales de espinhas e quadris. Não tinham tempo para o mundo, pois ser os consumia, obrigava-os a fugir da responsabilidade dos sonhos paternos, do subalterno, sofriam o custo de decidirem seus destinos mais de duas, três vezes ao dia. Foram tudo e de todos, juntos. Ela sentia falta do peso exato de seu corpo, da barba por fazer e de quando ele a empurrava contra a parede, tanto quanto os dias em que ele cozinhava de surpresa as mesmas coisas de sempre e fumava na janela do corredor quando estava chateado. O sorriso. A falta era igual. Sentia saudades de fazer de conta que sabia das coisas, de diagnosticar e fazer curativos no dedinho do pé dele, e de como ele realmente acreditava. A casinha de brinquedo onde ele disse tudo antes que o sol nascesse, o colchão velho, as roupas gastas, as cicatrizes. Dinheiro fácil que eles beberam. Foram suas mães, seus amantes, inimigos e traidores. E ela sofria de desgosto quando lembrava de escolher o que relevar, pois estar viva era o que lhe bastava.