Nada a perder Não me venha com... Gabito Nunes
Nada a perder
Não me venha com "temos de conversar, aconteceu uma coisa". Uma coisa não simplesmente acontece. Você precisa apertar um botão pra isso tudo "simplesmente acontecer". Duas pessoas não resolvem dar uma escapulida sem antes um bom flerte, alguma negociação e um punhado de telefonemas.
Todos passam por isso, todos vivem aquele fragmento lúcido de tempo em que é necessário decidir entre resistir ou fazer a coisa - esta é diferença entre nós. Duas pessoas resolveram acontecer. Você está entre elas e é isso que dói um pouco. Outro erro grostesco na construção das suas desculpas esfarrapadas: não há mais o que conversar. Vamos evitar olhares de lamentações, desprezos e resignações.
O que você quer? Absolvição? Aplausos? Ver nos meus olhos uma ponta de dor? Que eu desague um rio de lágrimas? Correção? Desculpa entrar na brincadeira sem julgar seu acontecimento como uma mera molecagem credora de castigo. Nunca fui sua mãe e você já não é mais criança, posso afirmar, apesar da sua ingenuidade em pensar que assim a coisa soaria mais honesta. A pior ingenuidade é achar-se esperto.
Não importam os pontos já somados ou o quanto você foi legal, seremos julgados eternamente por um único e isolado e grande erro. Sinto muito, é assim que funciona. Não existe justiça nisso que chamamos de "vida". Às vezes somos resumidos por aquilo que só fizemos uma vez, se acaso aquilo que só fizemos uma vez modificar alguém para sempre.
Aliás, foi melhor? Foi bom? Me diga. Me conte. Roteirize a cena pra mim. Vamos lá, eu quero saber. Entrei no seu jogo e estou dando uma oportunidade pra você se gabar. Não desperdice. Pegue. Foi bom? Foi melhor? Espero no mínimo um sim, que tenha valido a pena, porque você pôs a perder algumas coisas que até ontem pareciam importantes. Defenda-se.
Sabe, sobre esse seu "amor" que você está dizendo. Eu posso ouvir você dizer milhares de vezes, mas não significa que uma junção de palavras vai me fazer sentir como era antes, tudo outra vez. Seria até bom se você ficasse quieto e deixasse a reputação do amor intacta. No futuro ouvirei de alguém que esse alguém me ama e quero ter um conceito melhor sobre isso.
Vamos fazer assim. Sem traumas. Sem dramas. Sem dores. Seria exagero dizer que você faz o mundo melhor. Você não é pra tanto, mal dá pro gasto. Mas que fica tolerável, não posso negar. É que... já não estamos nos falando direito mesmo, então acho que preciso aproveitar que nós dois não somos uma aposta segura a longo prazo e que também não sou assim, tão louca por você.
Nada parece fazer diferença agora e tudo indica ser uma boa hora pra largar mão disso de qualquer forma. Não é como se estivéssemos perdendo algo. Eu vou dar uma volta, refrescar as ideias. Quando eu voltar, não quero mais vê-lo aqui. Se ainda estiver, então entenderei que sou eu quem deve sair.