EU TE DIRIA - Mira os teus ouvidos nos... Naeno Rocha

EU TE DIRIA

- Mira os teus ouvidos nos martelos
E suas toscas investidas na bigorna.
Olha nos passarinhos distantes
Aqueles que cantam soltos.
E nos tristes, os que se chamam encantados,
Que dedilham a lira e as estrelas, dançam.
Tudo isso é mudo e surdo
Mas perceptíveis à alma quieta
- Olhas no verde mais intenso, porões da mata.
Dos vales que eu nunca vou pisar.
E saberá de minhas vontades
Aquelas mais desertas, além, além
As que eu quero tirar da minha visão
Que só farei quando aprender a voar.

Mirava o retrato que me fala
Nas vezes que o procuro na gaveta da saudade.
É mesmo um castigo,
E condenado fui, já, tantas vezes.

Relia um poema de Fernando Pessoa
Que ele construiu, perdido dentro das pessoas.
As venturas da lua e o que a gente escuta
Quando era Jesus Cristo falando
A voz que a gente decifra quando quer.
Segredava baixo em seu ouvido,
E se me acordasse
Me elevaria ao seu guardião.
Mas a palavra lembrada em tempo
Eu me obrigaria a falar.
Falava do velho camponês,
Que guarda zeloso seu rebanho,
E veio o vento tão impetuoso
E não arrastou nem um do seu ganho.
Citava a contravenção do tempo
Levando escondido em seus bornais
Amores que a gente pensa uma vida
Encontrar, amar, pra depois separar.