HONTEM Eduardo B. Penteado Sinto-me oco... Eduardo B. Penteado

HONTEM
Eduardo B. Penteado


Sinto-me oco
Então bebo da água de hontem
Ela tem gosto de ossos secos
E resquícios de outros gostos
A água de hontem tem gosto de corpos
Frios corpos funestos
A água de hontem sai de corpos mortos
Corpo, rosto, objeto
Encho o meu copo e acabo com o fastio
Encho o meu corpo de um espaço vazio
Sinto-me louco
Então inundo-me da água de hontem
Ela tem gosto de vermes secos
E resquícios de outras mortes
A água de hontem emana dos cortes
Na pele de corpos inertes
Dermes
De onde exala o odor mutilado
Enoja-me a visão de meu corpo jugulado
Sinto-me pouco
Então afogo-me na água de hontem
Ela tem gosto de todos os meus medos
E resquícios de velhos horrores
Ela encerra espectros e esqueletos
E ressuscita minhas dores
Neutraliza minhas cores
A água de hontem secou as minhas flores.