"Desde que Augusto começou a falar... Mayara Freire

"Desde que Augusto começou a falar seus pais notaram a determinação que ele tinha. Era muito decidido, mesmo tão pequeno. E, em 1937, quando ele tinha 7 anos sua vizinha deu à luz a uma linda criança. Os pais dela não queriam que Augusto chegasse perto da criança, ele poderia ser desajeitado com a criança. Mas, depois de alguns dias, Augusto viu a criança e se apaixonou no mesmo instante. Os pais de Augusto, quando souberam desse amor, ficaram bravos e mandavam que ele parasse com aquilo antes que os vizinhos achassem ruim. Augusto se calou, por anos, mas não deixou de acompanhar a infância daquela menina, a adolescência. Todos achavam lindo a maneira como ele cuidava dela, e a desculpa era porque ele não tinha irmãos e nem ela, e como ele a viu crescer, tornaram-se irmãos... Augusto foi parceiro de brincadeiras, melhor amigo, acompanhou ela no dia em que um rapaz a queria pedir em namoro, fazia papel de irmão mais velho; mas ele nunca namorava, ninguém nunca o via com ninguém. Até que, ao seus vinte e seis anos e depois que ela terminou seu noivado de três anos, ele resolveu contar a verdade. A verdade era que desde que ele tinha visto ela, recém-nascida, ele reconheceu o seu grande amor e esperou por ela todo aquele tempo. Que ele tinha sido seu amigo, seu irmão mais velho, por um amor incondicional que ele carregou desde os sete anos. Ela não sabia o que dizer, ficou confusa, mas no fundo sabia que desde que seus olhos cruzaram com os dele seu coração se aqueceu e sua alma sabia que aquele era o seu grande amor. E eles casaram, depois de dois anos. Ele com vinte e oito, ela com vinte e um. Tiveram cinco filhos e foram exemplos de um amor verdadeiro. Augusto morreu há dois anos, e eu encontrei ela hoje, no banco. Ele morreu aos setenta e sete anos, segurando a mão dela, sussurrando que a esperaria do outro lado. E eu conversei com ela hoje, a Maria, o único amor de Augusto. Ela estava fazendo um seguro de vida porque sabe que seu coração está parando, aos poucos. Vai juntar todos os filhos esse final de ano, como o último final de ano que passarão juntos... E ela não cansa de dizer que sabe que vai morrer, logo; porque seu coração não sabe mais viver sem o seu amor. E, ela saiu... Andando devagar, com a mão no coração, segurando um coração que abria e mostrava uma foto em preto e branco de Augusto. E eu fiquei olhando e imaginando as lindas lembranças que ela não carrega do seu único amor.... Aquele que a viu nascer e desabrochar pra vida e pro amor. Pro amor de Augusto."