Insaciedade A alma doía-me... E o... Esmeralda Ferreira Ribeiro

Insaciedade

A alma doía-me...
E o peito,
dilatado,
lacerado,
esvanecera.
A mente,
audaciosa,
pertinaz,
em fuga louca,
desvairada,
sedenta,
corria, corria, corria...
0 coração,
esse, chorava.
E eu...
estava absorta,
delirante,
extasiada,
vencida...
Foi então que quis vencer;
e a lutar,
gestos convulsos,
ossos rangentes,
o meu castelo transpus.
Corri, corri,
voei,
aspirei,
sorvi quanta vida encontrei.
Tinha ânsia,
ânsia de mais vida!
Cores, odores e sons,
formas e movimentos,
tudo,
tudo devorei.
Pedi a graça às flores
e a sua beleza cantei.
Hauri o cheiro plúmbeo
do terrunho nas lavradas;
e nos bosques,
a folhagem ondulante,
esmeraldina,
me embalou.
Aos mares
pedi a vastidão,
às ondas
a violência,
às brisas
a suavidade.
Às distâncias,
um longo beijo atirei...
Às aves
pedi o canto
e a música
e a alegria;
e aos homens...
mundos de amor,
abismos de fé,
complementos de humanidade.
Tudo vi,
tudo amei,
de tudo apeteci.
Creio, mesmo,
com paixão
de tudo me enamorei.
E com a mesma dor,
ou maior ânsia,
voltei.
O coração inda chorava,
e os olhos choravam,
e a alma chorava
e sofria.
Fiz apelo à razão...
Mas, ai, dói-me a alma
Quanto me dói o coração!...

Abril / 1962