Se desfazendo das amarras João era... Eduardo Gonçalves
Se desfazendo das amarras
João era astuta, uma baleia astuta,
Pois via que, tinha a capacidade de enxergar lógica nas coisas de forma suficiente para otimizar seus feitos, coisa que muitos não conseguiam,
Muitos objetivos alcançados sem dúvida,
Seu senso do prático era recalcado de realidade,
Só dava passos se estes fossem construídos com a argamassa da razão,
Não tiremos seu mérito, não é culpado por apenas ter obtido o sucesso de forma matemática.
Se comportava como uma barragem que continha a força das águas, de grandes rios que suplicavam por liberdade, rogavam que libertasse suas correntezas. Ia as soltando conforme apercebesse necessidade para tanto, razão para tanto.
A baleia Pedro, irmão de João, via-se passível a dinâmica do querer, era como um barco sem motor em um rio,
A correnteza era forte quando se apaixonava,
Rapazote de apego fácil,
No dia crítico,
Surge moça de bocado de predicados,
O rio agitou-se, correnteza irredutível, levava quase tudo, Pedro desesperou-se -por não saber se ouvia o irmão ou continuasse a ser como era- ao se deparar com o irmão, que lhe disse:
-Quer um conselho? Construa uma barragem, assim seu barco encontrará águas calmas, sem correntezas, poderás descansar no lago represado, rico em peixes garantidos, a minha represa é grande, imponente, libero o rio quando quero.
João de forma alguma teria coragem de ter se deixado levar pelas correntes fortes, não sabia onde aquelas turbulentas águas o levaria. Já tinha sucesso, era rico, seu rio se tornou num lago, águas paradas, conheciam apenas aquele espaço mas eram cristalinas, ricas em peixes.
Pedro sofria com a instabilidade de seu barco sob fortes águas, mas segurava firme, lutava contra os desgovernos constantes de sua embarcação. Não tinha fixação, sua vida era uma mudança constantes de paisagens, não sabia no que ia dar toda aquela viajem, todo aquele trabalho em por o barco no rio e se deixar levar por suas águas.
Quando a rapariga agitou seus rios, trazendo fortes correntes, foi ali que ele percebeu que deveria se segurar mais firme ainda em sua fé na jornada. Novamente, não sabia qual seria o fim daquele ato leviano visto assim por João, mas mesmo assim acreditava fortemente em um bom fim.
Voltando ao dia crítico, eis que Pedro retruca ao irmão:
Quero ver o que tem no fim desse rio, se construir a barragem, ele parará e nem mais será um rio, não haverá correnteza, não havendo correnteza, como chegarei até o fim do rio?
Assim, Pedro continuou a descê-lo, sem medo.
Passado algum tempo, a baleia Pedro avista a foz, atordoado com tamanha beleza, encontra um horizonte infinito de águas. Pedro morreu naquele oceano, àquela correnteza o levou para aquele paraíso, felicidade interminável, liberdade infinita. A baleia João viveu bem, tinha muita comida, no final da vida já se encontrava cansada, aquele lago já havia a deixado enfarada do espaço limitado, seu tédio era grande, não conheceu o mar, morreu sozinho, era a baleia do lago, farta de peixes fáceis, garantidos, nunca experimentou a adrenalina proporcionada por uma correnteza, por um rio que corre livre e solto como deve correr, que com toda a sua simplicidade desce o vale, naturalmente pela força da gravidade, “cai”, de forma passiva, enfrentando os obstáculos de forma a sempre contorná-los, sem bater de frente como o mesmo, com sabedoria. Mas desce, desce em direção ao mar, com toda a naturalidade de apenas escorrer a encontro da grandiosidade, do símbolo do infinito, o mar.