⁠Crônicas de Diane Leite Capítulo 2-... Diane Leite

⁠Crônicas de Diane Leite Capítulo 2- Encontrando a Luz nas Sombras Quando algo dentro de nós se despedaça, não importa se era feito do mesmo sangue. Importa que... Frase de Diane Leite.

⁠Crônicas de Diane Leite

Capítulo 2- Encontrando a Luz nas Sombras

Quando algo dentro de nós se despedaça, não importa se era feito do mesmo sangue. Importa que existia.

Meu irmão não veio do meu ventre, mas do coração do homem que me adotou. Meu pai trouxe-o para casa como um presente embrulhado em silêncios um menino de olhos largos e histórias que nunca contou. Ele não era meu sangue, mas era meu espelho. Nele, eu via o reflexo de tudo o que eu poderia ser: corajoso, inquieto, inteiro.

Quando ele partiu, levei anos para entender que a dor não escolhe laços. Ela simplesmente chega.

O vazio que não pertence a ninguém

Sua ausência não foi um rompimento. Foi um desmonte. Como se alguém tivesse retirado uma parede da casa da

minha alma, e eu passasse a viver sob céu aberto, exposta a todas as tempestades.

Engordei 35 quilos. Mas o peso real não estava na came. Estava no silêncio que ficou. No telefone que nunca mais tocou. No hábito de olhar para o sofá onde ele se sentava e ver apenas o vazio moldado em forma de humano.

O sinal que veio en pedaços

Até que um dia, meus cristais se partiram.

A pirita, que brilhava como douro falso, rachou-se em três. O quartzo, minha lente para enxergar o invisível, lascou-se como gelo sob sol. E a amazonita, minha pedra da coragem, evaporou.

Naquele instante, entendi: era um retrato do que eu mesma. havia feito com minhas memórias. Guardara cada fragmento dele em caixas lacradas. Transformara nossa. história em museu de coisas que não podia tocar.

Os cacos no chão não eram acidente. Eram um sussurro: "Você também pode se reconstruir."

A lição das pedras que não são perfeitas

Peguei os pedaços da pirita. Eles ainda cortavam a pele, mas agora brilhavam como estrelas caldas. Percebi que a força não está no que é intacto, mas no que sobrevive à queda.

O quartzo rachado ainda refletia a luz, só que agora em direções que eu nunca havia notado. Como se minhas certezas precisassem de rachaduras para que a verdade

entrasse.

E a amazonita? Talvez ela não tenha desaparecido. Talvez tenha se tornado vento, o tipo de coragem que não se guarda, mas se sente na pele.

O enterro das memórias congeladas

Enterrei os menores fragmentos no jardim, ao lado da

mangueira que meu pai plantou no dia em que me adotou. A terra aceitou tudo sem julgamentos. como sempre faz com o que não sabemos onde colocar.

Os pedaços maiores guardei em um pote de vidro. As. vezes, balanço-o e ouço o som dos cacos se tocando. É a melodia das coisas que não precisam ser perfeitas para serem sagradas.

A pergunta que mora nas sombras

O que você insiste em guardar, mesmo sabendo que já não

cabe em você?

Talvez seja um nome que você repete como oração, mesmo que a pessoa não ouça mais. Uma fotografia que você esconde porque dói menos que queimá-la. Ou um segredo que você carrega como se fosse sua cruz, não percebendo que a madeira já apodreceu

Não importa. O que importa é que nenhuma despedida é definitiva. Até o que se vai continua nos transformando.

O exercicio do caco de vidro

Feche os olhos. Imagine-se segurando algo que um dia foi inteiro e agora está partido. Pode ser um objeto. Uma promessa. Um pedaço de si mesmo.

Agora, responda em silêncio: se você soltasse isso, que espaço novo nasceria onde antes havia peso?

Não precisa responder agora. A resposta virá. Talvez no meio de um café frio, ou no instante em que você perceber que o vento ainda toca seu rosto, mesmo quando ninguém mais o faz.

A verdade que ninguém conta

Hoje, carrego uma nova pedra no bolso. Não para substituir as antigas, mas para lembrar que até o que não era nosso por sangue pode ser eterno por amor.

E você? O que vai fazer com os cacos que insiste em

chamar de "seus"?

Guardá-los como prova de que um dia existiram? Ου plantá-los como sementes de quem você ainda vai se tornar?

A escolha é sua. Mas saiba: a luz mais bonita é a que nasce das rachaduras.

Diane Leite