Capítulo 6 – Pontes Invisíveis A... Diane Leite

Capítulo 6 – Pontes Invisíveis
A Tecelagem dos Dias
Há fios que não se veem, mas se sentem.
Alguns cortam a pele como farpas.
Outros envolvem o peito como a luz do entardecer que persiste, mesmo depois do sol sumir.
Naquele café, o cheiro de café queimado se misturava ao perfume da amiga – canela e lágrimas secas.
Ela ria de um jeito que fazia o ar tremer, enquanto histórias escapavam de sua boca como pássaros feridos.
Você já reparou como algumas conversas sussurram diretamente nas suas cicatrizes?
Como se o outro soubesse, sem saber, onde você guarda seus segredos mais frágeis?
Palavras soltas no ar, mas que pousam exatamente onde há dor.
Quem foi a última pessoa que te tocou sem encostar?
Quem te enxergou de verdade, sem que você precisasse dizer uma palavra?
Colisões de Almas
O homem na praça tinha olhos de mapa antigo.
Quando falou da esposa morta, suas mãos desenharam no ar o contorno dela – um fantasma que riu, dançou e se dissolveu em poeira dourada.
A artista na galeria usava um vestido pintado de nuvens.
"Me cobrem para caber em molduras", disse, enquanto colava estrelas no teto.
Cada uma brilhava mais forte quando alguém parava para olhar.
E eu, entre eles, sentindo o mundo em camadas.
Cada detalhe um portal para dentro.
Asperger não é rótulo, é língua materna.
Foi essa palavra que me deu chão quando meus pés só encontravam abismos.
Mas e você? Qual nome te deu chão?
Que palavra mudou tudo para você?
Pequenos Terremotos Cotidianos
A mulher do mercado carregava sacolas e dores invisíveis.
Nossos dedos se esbarraram no cabo do saco de laranjas.
Algo pulsou.
Dois corpos compartilhando o peso fugaz de existir.
Você conhece o som de um "obrigado" não dito?
É igual ao de um pássaro batendo asas dentro do peito – abafado, mas insistente.
Toda troca planta sementes.
O olhar que devolveu cor a um rosto apagado.
A xícara de chá passada em silêncio que falou mais que discursos.
O instante em que você segurou um pranto alheio como se fosse seu.
O tempo todo estamos tocando alguém.
Mesmo quando não percebemos.
Se soubesse que este é o último momento de alguém ao seu lado,
você mudaria a forma como olha, como fala, como ama?
Raízes e Asas
Relações verdadeiras são como rios.
Às vezes transbordam, às vezes secam, mas sempre moldam as margens.
Naquela noite de confissões:
O medo dela ecoou no meu vazio como um trovão.
O café esfriou enquanto ríamos de dores que já não doíam.
O relógio parou, mas o tempo avançou em nós.
O essencial está no que fica entre as palavras.
Na forma como seu corpo se inclina quando reconhece no outro um pedaço perdido de si.
No frio na nuca quando a verdade escapa sem permissão.
No espaço que você abre – nem cova, nem altar – onde a vida respira sem máscaras.
Quantas vezes você deixou passar um abraço que poderia ter dado?
Quantos "eu te amo" você engoliu por orgulho?
Último Convite
Feche os olhos.
Sinta o peso do celular no seu bolso.
Lembre do último abraço que deixou marcas de calor em suas costas.
Agora imagine.
Fios de luz ligando seu coração a cada riso, cada olhar, cada mão que um dia tocou a sua.
Alguns tensos. Outros desfiados.
Muitos ainda à espera de um nó.
Não precisa responder agora.
Mas quando a próxima pessoa cruzar seu caminho...
O que você fará diferente?
Diane Leite