⁠O Bicho Na rua estreita, o breu fazia... Ubiatá Meireles

⁠O Bicho Na rua estreita, o breu fazia morada, as lixeiras reviradas em estranha balada. Passos cautelosos, silêncio a pairar, o mistério na noite me fez hesita... Frase de Ubiatá Meireles.

⁠O Bicho

Na rua estreita, o breu fazia morada,
as lixeiras reviradas em estranha balada.
Passos cautelosos, silêncio a pairar,
o mistério na noite me fez hesitar.

Que ser seria aquele, que ali remexia?
Um animal furtivo em busca de energia?
Talvez um gato, um cão em desespero,
no lixo, seu banquete, um sonho tão efêmero.

Mas ao me aproximar, tremi de assombro,
o que vi não era fera nem monstro do lodo.
Era um homem, dobrado, retorcido de fome,
o "bicho" era humano, sem nome, sem sobrenome.

Olhos vazios, um grito calado,
pele marcada, um destino estragado.
Vi nos seus gestos o peso do mundo,
um eco que grita num abismo profundo.

Meu Deus, pensei, que ironia tão fria,
a cidade dormia, mas sua dor fervia.
O bicho é um homem, e o homem é o bicho,
um ciclo cruel, um abismo sem nicho.

Voltei ao silêncio, mas nunca esqueci,
do rosto marcado que ali descobri.
Que futuro nos resta, que mundo sem chão,
onde homens viram bichos na escuridão?