A Ausência dos Meus Excessos Um dia,... nereu alves

A Ausência dos Meus Excessos
Um dia, meus excessos sumiram,
sem alarde, sem vestígio.
Não deixaram saudade,
pois ninguém sente falta
daquilo que nunca coube direito.
Talvez os pássaros saibam,
as aves, sim, talvez cantem baixinho
em algum céu de lembrança,
que um dia eu tive asas
— mas bati demais.
O excesso não pesa como a falta.
O cheio, a gente desvia.
Mas o vazio... ah, o vazio
grita no silêncio do quarto,
dói no espaço onde eu era demais.
Não houve pranto pela minha ausência,
nem uma cadeira vazia no jantar.
A escassez marcou presença
onde o excesso foi apenas visita.
Fui demais nas palavras,
no riso alto, no gesto largo,
na vontade de estar,
na esperança de ficar.
Mas o mundo ama o contido,
o que cabe na medida certa,
o que não transborda.
E eu, feito mar em dia de fúria,
nunca soube ser maré baixa.
Minha presença era tempestade
num copo que só aceitava goles.
Agora sou ausência —
dessas que não incomodam,
dessas que não se nomeiam.
Sou o eco do que fui,
numa sala onde ninguém chama.
Mas ainda há beleza no que sobra,
mesmo quando falta tudo.
E se um dia alguém notar
a ausência dos meus excessos,
que perceba:
era amor, era sede, era alma
em carne viva.