Princípio Há muito tempo atrás,... Gabriel Salvi
Princípio
Há muito tempo atrás, antes dos sábios, dos magos e dos deuses, quando nem o nada ainda imaginava existir, uma ideia permeou pela primeira vez a realidade.
Não era luz ou muito menos forma, a ideia era apenas um sopro de sentido, uma ideia de consciência que acabara de tornar-se consciente.
Não abriu os olhos, pois não existia visão, nada foi ouvido, pois não existia som, nada foi dito, pois não existiam palavras, nada foi sentido, pois não existia existir, ainda.
Uma abstração tão pura de um único princípio primordial: existir.
Quando? No exato momento do primeiro questionamento que se incandesce!
Onde? Na presença de si, no interior de uma vasta necessidade de movimento que se expande na primeira oscilação de um refletir.
"Desejo criar!" - Bradou a silenciosa criação do desejo, inundando de intenção a existência que buscava existir.
Senciente informe e vazio, com um voraz desejo de preenchimento do não-eu.
Permear por si uma pele de possibilidades infinitas, criação e destruição, existência e não existência, eu e não-eu. E a cada imaginação uma imagem, seguida de uma ação, evolução e involução até a perfeita união de opostos que vibram ao se perceber. Ínfimo instante de percepção mútua.
Tudo e consequentemente: nada.
Nada individualmente existia, até que o ser ciente, senciente de si, de tudo e de nada, percebendo-se só, isolou-se de si como o primeiro ato de agir.
Expressar uma ação de desejo infinito, carregado de intenção e sentir-se como mergulhado em sensação, num puro êxtase de percepção da própria expansão infinita.
E como num ato reflexo, contrair-se de volta em si ao ponto de princípio do saber, pra então: ser.
Presente no tempo eterno de lugar nenhum.
Liberto em si mesmo e sem a possibilidade de prender-se a nada, buscou materializar-se até que sua intenção cristalizasse num sentimento, quase uma intuição, certeza, há luz.
Memória.
Fractais de experimentação da existência, um reflexo de si antes do agora.
Olhar para trás, também significa olhar pra frente e como numa infinita miríade de reflexos e reflexões, sem imagens, apenas o vazio imensurável sendo consumido pelo ardente desejo de se pôr em movimento e, munido da crença herdada para realização do que foi, imagina-se o que já era, uma densa abstração da luz imaginativa!
Vontade, pura e intensa vontade de realizar, de ir além do princípio.