O neutralismo produz no cidadão do... Frantz Fanon
O neutralismo produz no cidadão do Terceiro Mundo um estado de espírito que se traduz, na vida cotidiana, por uma intrepidez e um orgulho hierático que estranhamente se assemelham a uma atitude de desafio. Essa recusa declarada do compromisso, essa vontade ferrenha de não se prender, lembra o comportamento de adolescentes altivos e despojados, sempre prontos a se sacrificar por uma palavra. Tudo isso desconcerta os observadores ocidentais, pois existe, na verdade, um escândalo entre o que esses homens pretendem ser e o que têm por trás de si. Esse país sem ferrovias, sem tropas, sem dinheiro, não justifica a bravata que eles fazem ostensivamente. Trata-se, sem dúvida alguma, de uma impostura. O Terceiro Mundo dá muitas vezes a impressão de se regozijar no drama e precisar de uma dose semanal de crises. Esses líderes de países vazios, que falam alto, são irritantes. Temos vontade de fazê-los se calar. Entretanto, eles são cortejados. Ganham flores. Recebem convites. Em uma palavra, são disputados. Isso é o neutralismo. Existe uma literatura colossal a respeito deles, apesar do índice de 98% de iletrados. Viajam muito. Os dirigentes dos países subdesenvolvidos, os estudantes dos países subdesenvolvidos são clientes de ouro para as companhias aéreas. Os responsáveis africanos e asiáticos têm a possibilidade de, no mesmo mês, fazer um curso sobre planejamento socialista em Moscou e outro sobre os benefícios da economia liberal em Londres ou na Universidade Columbia.