Bem-aventurados vós, que alegres... J. C. F.
Bem-aventurados vós,
que alegres festejais em torno dos cálices sagrados,
sempre transbordantes de vinho e graças e virtudes.
Para vós, ó inebriados, a felicidade é tangível,
como um carro que se põe na garagem
ou um iogurte light que se compra no supermercado,
independentemente de vulcões e maremotos
e infâmias e cárceres e títeres e mártires.
Quando a mim, o que posso dizer?
A taça de minha existência tem sido uma só,
e ela se quebrou irremediavelmente.
Para além de qualquer religião ou neurolinguística,
deixou de ser o que era: é, antes, uma não-taça.
Nada retém, além de pó e aflição.
E, como me recuso a imaginá-la inteira,
às vezes penso que também não tenho conserto.