Que o isolamento nos sirva Que o... Graça Leal
Que o isolamento nos sirva
Que o isolamento social sirva para revitalizarmos valores reais, valorizarmos a vida real e preservarmos o que, no nosso íntimo, é, ou passou a ser, precioso.
Que o isolamento social sirva para olharmos menos para espelho e mais pela janela; sirva para, quando voltarmos às ruas, contemplarmos o movimento inevitável que conduz a rotina diária de cada um de nós, que é o principal recurso para a nossa sobrevivência psiquicosocial, e contemplarmos menos os supérfluos que se apresentam na palma das nossas mãos através de publicações deprimentes que bombardeiam o nosso intelecto na tentativa de nos recrutar para multiplicarmos vazios célebres e anônimos, notórios e ocultos, contidos em conteúdos e imagens produzidas, filtradas, frias, inúteis e ineficazes no processo da evolução civilizatória, bem como no nosso processo individual de crescimento.
Que o isolamento social tenha o poder de nos mostrar a
Importância que devemos atribuir às pessoas que cruzam os nossos caminhos e não sucumbem diante da demanda da hipocrisia na consequente troca natural na relação, e que são capazes de nos dizer o "não" e nos trazer à realidade quando insistimos em fugir do rumo da paz interior, muitas vezes sem percebermos, por mera vaidade, influências externas, ou por devaneios da alma, pois estas pessoas, no fundo, nos desejam o bem de verdade; o bem pouco praticado, porque perdeu espaço para o bem conveniente e para o politicamente correto.
Que o isolamento social sirva para resgatarmos, no caso de alguns dispersos que sirva para apresentar, tudo aquilo que compõe a individualidade, a identidade impressa em cada um de nós, e que é capaz de nos fortalecer frente aos chamados das fraquezas diversas a fim de evitar que passemos a vida tentando nos adaptar à padronização de comportamentos, de aparência, expressões e bandeiras que só nos distanciam de nós mesmos, e de muitos dos nossos iguais, enquanto nos tornam incoerentes no processo linguístico de defesa dos valores coletivos quando, simultaneamente, agimos investindo no que só vai beneficiar poucos individuos, em especial aos que compartilham da mesma carência - da ausência de relação ativa com a própria identidade - ou aos nossos seletos iguais.
Que o isolamento social sirva para nos proteger, ou nos curar, não só do Covid19 mas especialmente do que em nós só nos torna uma mera figura, um objeto de exibição e manipulação que contamina e adoece o nosso bom senso na arte, por vezes, literalmente, cênica, de nos posicionarmos como "bem intencionados" nas nossas ações.