Carta de despedida Em minhas... LIZ
Carta de despedida
Em minhas divagações fui motivada a te escrever. Engraçado, porque sei que essa carta nunca chegará a você. Mas é uma forma de me despedir. Sim! Me despedir de um sonho que perdurou por mais de seis anos. Quantas vezes ensaiei o fim. Tantos planos fiz. Dentre todos eles, o maior desejo era fugir. Tinha até criado um plano de fuga. Me organizaria por alguns meses, depois pediria as contas aqui no trabalho, colocaria as poucas roupas que tenho numa mochila e sairia para um ano sabático. Olha que essa ideia se tornou fixa dentro de mim. A cada crise, a cada desentendimento nosso eu dizia “é o que preciso fazer”, um tempo longe de tudo e de todos, numa busca desesperada de me encontrar. Mas a medida que nossa despedida foi, de fato, se aproximando, percebi que não adiantaria ir para muito longe. O sentimento de dor, frustração, culpa, raiva e ciúmes perpetuaria em meu peito. E aqui estou, depois de muito chorar, muito refletir, tive que fazer uma escolha. Escolhi o umbral da porta. Guardo nossa aliança numa pequena caixa. Determinei que vou passar por todas as fases do final de casamento. Todas elas, sem exceções. Inclusive já me abstive de todas as redes sociais. O que os olhos não veem o coração não sente. Vou sentir tudo que tiver que sentir. Raiva, medo, ciúmes, conformismo e, por fim, a aceitação. Por muito tempo, tentei não enxergar o muro que existe entre nós. O perdão ainda não brotou do meu coração, mas saiba que estou trabalhando para isso. Quero que ele seja verdadeiro, seja real. Não vou dizer que está sendo fácil. Sou uma chorona, sofro calada. Minha vida toda tinha a ideia de que família e casamento eram para a vida toda, juntos ultrapassaríamos qualquer adversidade. Dediquei meus melhores sentimentos para que construíssemos um lar. Mas os sentimentos mudam. Nossas diferenças se realçaram a ponto de sermos duas estranhas. Hoje, admito minhas falhas, e com todo meu coração digo sinto muito. Sim, isso mesmo, sinto muito porque de longe fui a pessoa que você sonhou. Sinto muito, por muitas vezes dar causa as nossas brigas. Sinto muito, por muitas vezes querer tanto te fazer feliz que não deixei que você caminhasse com suas próprias pernas. Mas também sinto muito por mim. Repito exaustivamente para mim mesma o quanto sinto muito. Porque ignorei todos os sinais, por causa de um prazer momentâneo, de uma felicidade passageira. Sinto muito a mim, por me fazer passar por isso. E peço perdão pela dor que me causei e te causei. Peço perdão por não ter conseguido preencher as lacunas da sua vida, por não ter a compreendido. Por ter sido tão intransigente quando tudo que você queria era um apoio. Te peço perdão de todo coração. Da mesma forma que me peço perdão. Me perdoa por ter ido aquela estação de ônibus. Me perdoa por não ter tido a maturidade de me curar primeiro antes de tentamos mais uma vez. Me perdoa por não conseguir me perdoar. Porque, no final das contas, somos responsáveis por nossas escolhas. Então, me peço perdão por todas as escolhas que fiz que me levaram a você. Isso não quer dizer que não te amei, ou até mesmo que não te amo, o fato de sentir esse sublime sentimento não exime o arrependimento de ter te conhecido. Sim, nunca pensei que fosse dizer isso de alguém, até porque sei que nossas escolhas nos tornam o que somos. Mas ter ido àquela estação é um dos maiores arrependimentos da minha vida. Mesmo assim posso te dizer de peito aberto que te amo. Engraçado como é contraditório, como posso dizer que me arrependo de ter conhecido uma pessoa que me despertou o amor em sua forma mais suprema. Uma pessoa que, apesar de tudo, me ofereceu a melhor oportunidade da existência, que é a maternidade. Sim, te amo com todas as cores do arco-íris. Durante muito tempo dediquei o melhor de mim a você. Mas eu também me amo. E como me amo! Talvez seja por isso que, por mais doloroso que seja, escolho cruzar o umbral da porta. Porque quero me amar ainda mais. Quero me conhecer ainda mais. Quero desvendar todos os meus segredos. Seu amor turvou o sentimento mais singelo da humanidade. Amar deveria ser a coisa mais simples. Amor é a soma da cumplicidade + confiança + amizade. Uma tríplice. Só que em nosso relacionamento perdeu-se um pé. A confiança. Eu não confio em você, e sinceramente não sei se um dia serei capaz de confiar em você novamente, a repercussão dos seus atos tornou-se tatuagem em meu peito. Meu coração diz que há muitas coisas obscuras sobre você, coisas que jamais serão verbalizadas. Mas vou respeitar isso, cada um com seus segredos. Mas apesar de toda dor que circunda meu coração, de todo medo que sinto com esse novo construir, sou grata. Porque você me proporciona a oportunidade de meu autoconhecer. Você me mostrou que nem sempre o amor é a coisa mais importante para manter um casamento. Sou grata a você por me dar uma chance de ser uma pessoa melhor. Por analisar os meus erros e tentar não cometê-los novamente. Sou grata por aprender na dor. E sou grata a mim mesma pela oportunidade de me buscar, para que num futuro breve eu possa emitir os mais sinceros sorrisos. O mais apaixonado brilho nos olhos. Sou grata pela dor que agora me abate para que, quando eu encontrar outro alguém, possa oferecer um amor sem medo, sem reservas, pautado na cumplicidade + confiança + amizade. Porque o amor tem que ser, acima de tudo, nosso melhor amigo. Então, finalizo aqui com essas três frases que permearão no meu coração, e todas as vezes que meus olhos queimarem como agora, que a vista embaraçar, que a respiração acelerar, vou correr para um lugar privado e sem vergonha e pronunciar: sinto muito, por favor, me perdoe, te amo e sou grata. Com lágrimas riscando meu rosto. Mas serão as lágrimas da cura.