Acusando-me com o olhar Sempre me senti... Arcise Câmara
Acusando-me com o olhar
Sempre me senti acuada com olhar de julgamento, qualquer sinal de sintonia e desconfiança já me tira do sério, não vivo para agradar ninguém, mas amo retribuir com agrado quem eu amo e me faz bem.
Às vezes me sinto conectada, como se alguém fizesse aparecer à ideia dentro de mim, um mistério inexplicável, é raro eu pensar “minha nossa!”, mas me surpreendo sempre que isso acontece.
Descobri que algum lugar dentro de mim, um poço de maturidade. Já tenho 52 anos, já vivi tempo suficiente para me espiritualizar, deixar de acreditar em amuleto da sorte, aprender a perdoar o passado.
A escolha é óbvia até para uma retardada, a gente pensa isso depois que o click encaixa na nossa cabeça. Precisei examinar todo o meu subconsciente com cada detalhezinho.
Como eu posso explicar que durante anos eu não tenha pensado por dentro, nem uma vez sequer. Andava cheia de ilusões, só pensava em riqueza, descartava qualquer vida de voluntária.
E daí? Pensava eu, o mundo me cobrava respostas concretas e eu justificava que aquilo era para tirar o foco dos meus sonhos. No fundo, eu sabia que o meu destino não era o que planejei.
Não pude levar avante o discurso e a insensibilidade dos meus atos e palavras, meu caráter íntegro veio de fábrica, acompanhados de procrastinação e a minha habilidade em esconder minhas preferências mais simples.
Nesse campo propício dos altos sonhos, era preciso focar na própria vida e esconder a frustração de que ia passar a vida sem ser útil ao mundo. Viver é um milagre! Eu precisava ser grata!
Por meses, lutei de forma inapropriada para não enxergar as dificuldades além das minhas não reais necessidades. Eu vivia para impressionar os outros. Dizia que me amava, mas estava sempre tentando ser aceita até por quem não tenho intimidade.
Minha vida de não rica e de não apreciar tudo o que tenho me levou a ser julgada o tempo todo, era Deus que não pode dar asas a cobra. Poderia ter bem mais do que tenho se não decidisse compartilhar, mas a minha maior poupança é diminuir uma gota do oceano chamada: desigualdade social.