Você sabe o que é uma UTI ⁉️ Às... Odilon Silva
Você sabe o que é uma UTI ⁉️
Às vezes, vemos certas coisas, mas não enxergamos.
Nos últimos dias, durante o horário de visitas na UTI, eu estava desocupado e fiquei observando o que acontecia.
Na verdade, cenas que vi milhares de vezes, cenas que muitas vezes me emocionaram, mas que nunca havia escrito sobre elas.
Certamente, muitos dos que lerem isso já tiveram familiares em UTI ou trabalharam em UTI.
Mesmo que certas coisas aconteçam em qualquer lugar do hospital, na UTI convivemos com algumas particularidades.
Muitos dos pacientes que estão ali não sobreviverão.
Os familiares sabem disso e, certamente, muitos dos pacientes também. E, nesse momento extremo, literalmente entre a vida e a morte, o contato com os familiares é doloroso e carregado de emoções.
É extremamente comum os familiares tentarem dizer coisas que não disseram antes.
Chegam aos ouvidos dos pacientes e sussurram que os amam, com as mais variadas formas de declaração de amor. Pedem desculpas por erros do passado. Fazem promessas para o futuro.
Dão notícias dos familiares, mesmo que, em boa parte das vezes, os pacientes não consigam ouvir o que se diz.
Mas isso não importa. O que importa é que se diga o que deveria ser dito antes.
O carinho é obrigatório. Muitos beijam seus familiares, com lágrimas nos olhos, sabendo que talvez seja a última oportunidade. Um beijo de despedida, um beijo de “vai dar tudo certo”, um beijo que diz “eu te amo”. Quase sempre, o beijo é acompanhado por um carinho com as pontas dos dedos, em geral alinhando os cabelos, retirando-os da testa.
Um cafuné para aliviar o sofrimento.
Claramente, vemos nos olhos dos familiares, além da dor, um sentimento de arrependimento pelas oportunidades perdidas, das coisas que deixaram de fazer juntos, da saudade que sofrerão no futuro. Nada é mais doloroso do que ver o sofrimento dos pais, vendo seus filhos inertes num leito e eles, impotentes, querendo trocar de lugar com os filhos.
Muitas vezes vi pessoas deixarem seus familiares para consolar os visitantes ao lado.
Parece que o sofrimento abre as portas para a empatia e, num gesto de solidariedade, esquecem temporariamente a própria dor, para consolar ou oferecer conforto a pessoas desconhecidas, mas que vivenciam o mesmo sofrimento.
Trocam informações sobre seus familiares e torcem juntos pela recuperação de ambos.
Não raramente, as pessoas fazem uma vistoria, durante as visitas.
Levantam o cobertor, examinam os pacientes, avaliam os traçados coloridos dos monitores e respiradores artificiais, conferem os números nas telas, como se soubessem avalia-los.
Uns angustiam-se ao ver os tubos, sondas, cateteres e uma infinidade de dispositivos eletrônicos piscando e disparando alarmes. Outros, mais indiscretos e ousados, analisam os sinais vitais, anotações e prescrições, como se tivessem a capacidade de discernir o que é certo ou errado, ou como se soubessem compreender o que leem.
Terrível é ver uma mãe ao lado do seu filho, em coma profundo, em morte cerebral, tendo que decidir se doa ou não seus órgãos, travando uma batalha feroz entre a razão e a emoção.
Também doloroso é ver as reações de quem está deitado. Muitas vezes, o paciente tenta tranquilizar os familiares, apesar de saber da gravidade da sua doença.
Outras vezes, estão intubados, sem possibilidade de falar, mas seu olhar é mais expressivo do que palavras.
UTI não é para os fracos.
Trabalhar em UTI requer muito mais do que se imagina.
Não é fácil conviver com o sofrimento e a urgência, mas manter a frieza e a calma, para tomar as decisões certas. Não é fácil cuidar sem ser agressivo. Não é fácil saber até onde ir e quando desistir.
Não é nada fácil dar a notícia que ninguém quer receber. Por isso, e muito mais, respeitem quem se dedica a essa área tão nobre da medicina.
Mesmo que nem sempre se consiga ter êxito, posso assegurar que todos os que estão ali (médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, enfim, todos, sem exceção) dão o melhor de si, na tentativa de salvar os pacientes.
E, finalmente, mesmo que nem sempre pareça que eles veem o sofrimento dos pacientes e dos seus familiares, tenham a certeza de que eles têm plena consciência disso.