Se eu pudesse ter a oportunidade de ter... Edgard Abbehusen

Se eu pudesse ter a oportunidade de ter um dia ao lado das pessoas que eu amo e que já não estão mais aqui, eu só falaria do amor que sinto. Das coisas boas que deixei de fazer. Das boas palavras que deixei de dizer. Do abraço que não dei quando achei que teria bastante tempo. Se eu pudesse matar a saudade por um dia, eu tornaria aquele dia inesquecível. Aproveitaria ao máximo. Perguntaria todas as questões. Tiraria todas as dúvidas. Se eu pudesse ter mais uma conversar com o velho Hermano, meu pai, diria a ele o quanto eu o amo e demonstraria a curiosidade para saber como foi criar 10 filhos em um mundo tão complexo e difícil. E como foi a sensação de ter todos os seus filhos por perto no dia da sua morte. Eu tenho certeza que isso emocionou bastante meu velho. Se eu pudesse tomar mais um whisk com meu cunhado Nelson, eu pediria pra ele contar todas as piadas. Todas que ele soubesse. Pediria que ele fizesse a mágica de desaparecer a moeda e o cigarro e me ensinasse o truque para que eu pudesse divertir os meus filhos e sobrinhos como ele fez tão bem em vida. Se eu tivesse algumas horas a mais na minha rua, em Muritiba, ao lado de todos os meus vizinhos que já partiram, eu agradeceria tanto. Dona Zeca, Dona Dinha, Louro Chiada, Anun, Dona Isabel, Dona Dú, Dona Zizi, Seu Augusto, Bengo, Seu Paulo e tantos outros queridos. Reuniria todos em uma mesa e faria um brinde a amizade. E como eles foram importantes para a minha vida. Se eu tivesse mais uma chance com Seu Borges, pediria que ele me ensinasse algumas palavras em esperanto. E uns minutos com a Tia Hildete seria apenas para entender como aquela senhora da voz doce conseguiu enxergar tanta beleza no mundo. Eu não gosto de cemitério. Já furei vários enterros, já evitei vários velórios. A vida é tão bonita e a morte tão triste. Talvez não deveria ser tão triste assim. Quem sabe lá, do lado de lá, as coisas sejam melhores do que aqui. Ainda é cedo pra saber. Mas que fique claro pra gente que ainda está aqui, que o tempo ao lado de quem a gente ama pode acabar de uma hora pra outra. Então, que a gente aproveite. Que a gente aproveite a vida e em vida. Pois a saudade é cruel. Não passa nunca.