Todos tentam entender o que aconteceu... Arcise Câmara

Todos tentam entender o que aconteceu com você

Sempre fui àquela gordinha de bem com a vida, que comprava tecidos para a costureira porque estava cansada de ouvir das vendedoras que as lojas não tinham o meu número. Olha que meu grau de obesidade era um, imagina! Daí passei a ter roupas exclusivas e do meu estilo próprio intitulado carinhosamente por mim de Princesa Libertadora do Amazonas.
Uma vez ou outra a vista começava a escurecer, uma vez ou outra me sentia sufocada por estar deitada sem travesseiros, parecia absurdo, mas meu orgulho de ser gorda e quem me ame me aceite como sou foi para o ralo quando vi minha saúde abalada.
Mas o que me levou a malhar foi uma tristeza profunda beirando a depressão, já tive uma vez e reconheci os sinais, eu estava com uma sensibilidade exagerada, parei de gastar por falta de vontade de sair de casa, ver pessoas juntas, reunidas e felizes me deixava com um pouco de inveja. Passei a ficar nervosa, tensa, uma lagoa emocional.
O remédio receitado por mim mesma se chamava serotonina e adrenalina, já que todos falavam que era o hormônio da felicidade quem era eu para discordar. Como num clique percebi as mudanças positivas em meu corpo, minha mente.
Eu chorava quando dormia, não tinha um referencial de mim mesma, eu me achava obtusa e sem forma, ninguém se importava com aquele aperto na alma quando precisava conviver com os outros. Eu tinha a grande responsabilidade em me salvar.
Foi à época que eu mais me amei mesmo inconsciente, não tenho palavras para descrever aquele momento, eu estava à beira do precipício e aprendi a lidar com isso, eu estava no abismo da minha tragédia pessoal e estava lutando para sobreviver.
Os meus choros eram silenciosos, as lágrimas escorriam sem parar, eu era muito insegura, logo eu a gorda que se amava e dava até beijinho no ombro? Cada um de nós está extrai algo diferente dessa experiência, meu esforço constante era para me manter equilibrada.
O desejo de recriar algo maior em mim que me tornasse forte, que me deixasse de molho na piscina quando precisasse, que me fizesse refletir sobre as minhas certezas, que me deixassem longe do estereótipo de pele e osso.
Passei a viver cada dia como se fosse o último, encontrei amigos por aí, aprendi a curtir cereais, enganar a tristeza e não ceder aos meus caprichos camuflados de doenças.
Passei a ser mais controlada, algo me trouxe plenitude, uma compulsiva paz, um acreditar em Deus, um tchau para a culpa. Não desafiei a eternidade e o excesso de gordura dentro de mim, cedo ou tarde cobrou o preço.