Garantias no amor Como é fácil... Krishnamurti
Garantias no amor
Como é fácil destruir o que amamos! Com que rapidez surge uma barreira entre nós, uma palavra, um gesto, um sorriso! A saúde, o humor e o desejo nos entristecem e o que era maravilhoso torna-se insípido e opressivo. Pelo uso, nós nos desgastamos, e aquilo quer era vivo e claro torna-se cansativo e confuso. Por meio de constantes atritos, esperanças e frustrações, aquilo que era belo e simples torna-se terrível e cheio de expectativas.
Relacionamentos são complexos e difíceis, e poucos conseguem sair deles ilesos. Embora quiséssemos que fosse estático, duradouro e contínuo, o relacionamento é um movimento, um processo que deve ser profunda e completamente entendido, e não forçado a se conformar a um padrão interno ou externo. A conformidade, que é a estrutura social, perde seu peso e autoridade somente quando há amor. O amor no relacionamento é um processo purificador, pois revela os mecanismos do Eu. Sem essa revelação, o relacionamento tem pouca importância.
Mas como lutamos contra essa revelação! A luta assume muitas formas: controle ou submissão, medo ou esperança, ciúme ou aceitação e assim por diante. A dificuldade é que nós não amamos; e se nós de fato amamos, queremos que isso funcione de uma forma particular, não lhe damos liberdade. Nós amamos com nossas mentes e não com nossos corações. A mente pode se modificar, mas o amor, não. A mente pode se tornar invulnerável, mas o amor não; a mente pode sempre se retrair, ser exclusivista, tornar-se pessoal ou impessoal. O amor não é para ser comparado e tolhido. Nossa dificuldade está naquilo que chamamos de amor, que é realmente da mente.
Enchemos nossos corações com as coisas da mente e mantemos nossos corações sempre vazios e cheios de expectativas. É a mente que se apega, que é ciumenta, que controla e destrói. Nossa vida é dominada pelos centros físicos e pela mente. Nós não amamos e deixamos em paz, mas ansiamos por ser amados; nós damos a fim de receber, que é a generosidade da mente, não do coração. A mente está sempre buscando garantia, segurança; e pode o amor ser garantido pela mente? Pode a mente, cuja própria essência é temporal, perceber o amor, que é sua própria eternidade?
Mas mesmo o amor do coração tem seus próprios truques; pois corrompemos tanto nosso coração que ele é hesitante e confuso. É isso que torna a vida tão dolorosa e cansativa. Em um momento nós achamos que temos amor e no próximo ele é perdido. Aí entra uma força imponderável, que não é da mente, cujas fontes não podem ser sondadas. Essa força é mais uma vez destruída pela mente; pois nessa batalha a mente, invariavelmente, parece ser a vitoriosa. Esse conflito dentro de nós mesmos não será resolvido pela mente astuta ou pelo coração hesitante. Não há um meio, uma maneira de fazer esse conflito terminar. A própria busca por um meio é outro anseio da mente por domínio, para livrar-se do conflito e ficar tranquila, para ter amor, para tornar-se algo.
Nossa maior dificuldade é estar ampla e profundamente atentos ao fato de que não existem meios para o amor como um objetivo desejável da mente. Quando entendemos isso real e profundamente, há uma possibilidade de receber algo que não é desse mundo. Sem o toque desse algo, façamos o que quisermos, não poderá haver felicidade duradoura no relacionamento. Se você receber essa graça e eu não, naturalmente estaremos em conflito. Você pode não estar em conflito, mas eu estarei; e em minha dor e tristeza eu me desligarei. A dor é tão exclusiva quanto o prazer, e até que exista aquele amor que não seja uma construção minha o relacionamento será dor. Se houver a bênção daquele amor, você nada poderá fazer a não ser me amar pelo que sou, pois então não moldará o amor segundo o meu comportamento.
Quaisquer que sejam os truques da mente, somos independentes; embora possamos estar em contato um com o outro em alguns pontos, a integração não é com você, mas dentro de mim. Essa integração não é resultado da mente em nenhum momento; ela forma somente quando a mente está inteiramente silenciosa, tendo alcançado o limite de suas forças. Somente assim não existe dor no relacionamento.