Aparentemente, ao defender as Cruzadas,... Luiz Gonzaga de Carvalho...
Aparentemente, ao defender as Cruzadas, São Bernardo estava defendendo a existência de um território estritamente cristão e Jerusalém deveria fazer parte desse território. Num primeiro momento, então, a finalidade dessa defesa era de ordem política. No entanto, a finalidade ia muito além disso. A raiz da defesa de São Bernardo estava fincada, inicialmente, em sua contemplação da cristandade. Em segundo lugar, estava em sua percepção de que era estritamente necessário dar para as pessoas de índole aristocrática um direcionamento espiritual.
Não podemos esquecer que na Idade Média a Europa era composta por várias tribos guerreiras. O mesmo acontecia entre os índios da América do Norte. São Bernardo, então, questionou-se acerca de como essas pessoas de índole aristocrática poderiam assimilar o cristianismo e alcançar a santidade. O anseio de orientar espiritualmente os guerreiros europeus foi a motivação principal para a defesa de São Bernardo às Cruzadas, para a fundação da Ordem do Templo e para o delineamento dos ideais de cavalaria. São Bernardo foi o primeiro santo que delineou a imagem do legítimo cavaleiro cristão. Ele percebeu que a vida estritamente monástica e contemplativa era inconcebível para a maior parte dos aristocratas europeus. Compreendeu que o centro mais elevado e concebível para uma imensa parte da população européia era a nobreza de caráter e decidiu fazer desse centro uma via de santificação para os europeus.
Os aristocratas europeus, apesar de professarem sinceramente o cristianismo, idealizavam suas virtudes como oriundas de figuras mitológicas não-cristãs. Essa dualidade foi um grande problema na Europa. Os aristocratas europeus possuíam dois conjuntos de valores positivos, porém incompatíveis. São Bernardo foi o responsável pela solução dessa incompatibilidade. E para pôr em prática essa solução, São Bernardo defendeu as Cruzadas.
As pessoas podem achar qualquer coisa das Cruzadas, mas o número de aristocratas que alcançaram a santidade nesse processo foi incalculável. E santidade sempre é bom. É claro que São Bernardo sabia que as Cruzadas possuíam uma certa ambigüidade e não durariam para sempre. Mas ele também sabia que as Cruzadas definiriam a imagem exata do guerreiro cristão, sendo isso indispensável para a civilização cristã. A convicção profunda que nós temos hoje de que a força deve ser usada em nome da generosidade, da justiça e da nobreza é herança de São Bernardo. Se não fosse por São Bernardo, até hoje acharíamos que existem os brutos e inescrupulosos de um lado, e os cristãos que aceitam apanhar passivamente do outro. Não haveria qualquer possibilidade de solucionarmos essa dicotomia. O cristianismo não teria assimilado uma boa parte da sociedade e a sociedade não teria assimilado uma série de valores cristãos. São Bernardo foi o responsável pela existência de muitos santos e pela existência de um mundo cristão.