Yasendulo fora um ser mítico que... Andrê Gazineu

Yasendulo fora um ser mítico que ensinou a sabedoria à humanidade em um período antediluviano. Desde criança, Yasendulo teve sérios problemas de saúde, muitos deles neurológicos. Consta nas tábuas de argila que sofreu de abscessos assépticos disseminados, aceruloplasminemia, oxifellia e triqueneloso crônica aos dois anos. Teve delírios de ausência de fundamento na adolescência e foi internado em sanatórios sumérios 5.000 anos A.C. Sofreu na mão de curandeiros locais e psicanalistas por duas décadas. Tamava fluvoxamina sem receita, visto que a mesma ainda não fora inventada. Muito menos a escrita (e os curandeiros já tinham a letra horrível).
Um dia, Yasendulo parte sem rumo para o mais longe possível do que é hoje o Iraque e encontra uma tribo tão primitiva quanto gigantesca: 256 habitantes, econdendo-se na multidão. Seu comportamento apático o transforma, rapidamente, em um anti-líder nato. Um dos sábios da tribo, percebendo sua exímia capacidade de não liderar o procura ao anoitecer.

"Por que você não quer ser o santo das massas e dos demais gurindji, Yasendulo ?
"Eu não sou gurindji."
"Não importa. Aceitaria?"
"Não creio em países e não creio em nenhuma divisão política."
"Mas você tem vivido conosco. Comido nossa comida. Bebido da nossa água."
"Eu tenho de viver em algum lugar e por isso vivo aqui, mas não pertenço a este lugar."
"Você tem SANGUE nacionalista. Você tem esse verniz de fascismo nascionalista neurótico e displicente."
"E?"
"Você não é uma pessoa religiosa."
"Eu não sou gurindji, primeira coisa. E segunda, também não sou santo."
"E não pode ser?"
"Se eu sou um santo, então você é um pecador. Tem que ser pecador. Caso contrário, como eu poderia existir? Para criar um santo serão necessários milhões de pecadores."
"Temos três centenas..."
"Muito vou-para-o-céu-e-você-vai-para-o-inferno. Todos somos sagrados."
"Todos os gurindji?"
"TODOS NÓS. Consciência universal. Eu poderia ser um santo para os gurindji e um demônios para os chineses. Um santo neste século e um profano para o próximo."
"Pena eu ter esquecido a minha argila para entalhar isso. Pena eu ser analfabeto também."
"Não me permito ser definido por mais ninguém. Sou apenas eu mesmo."
"Isto soa MUITO BEM! Você será o maior profeta gurindji de todos os tempos! Precisamos de armas. Muitas."
"Armas?"
"Sim. Não quero toda essa violência. Estamos fartos de guerras e mortes. Você quer mortes?"
"Não!"
"Você é algum tipo de amante-de-mortes?"
"Nada de mortes!"
"E ficará aí parado? Crianças gurindji morrendo e você aí parado."
"Estou em renuncia. E quem está matando crianças gurindji?"
"Nós mesmos. Estamos sem um guia no momento."
"Deus..."
"Nada de Deus. As pessoas ainda não têm sua iluminação. Estão inconscientes. São cegas."
"Sim."
"Você é um bom observador, apenas isso."
"O que quer dizer?"
"Não tenho mais certeza se você daria um bom santo gurindji."
"Concordo."
"Mas seria um bom líder sindicalista."