Poema inspirado no drama estático de... Luciana Maria Tico-Tico
Poema inspirado no drama estático de Maeterlinck
a mãe é muda
o pai não pisca para não acordar a criança
que dorme ou mama
no peito da mãe
com os pés sobre o pai
a noite reclama
garoa fina
saudades de antes
uma nuvem de medo
distante se aproxima
os olhos estáticos da menina no rio
o corpo estendido no frio
vem boiando na água até a porta
da cabana de madeira
de paredes tortas
a noite é muda
mas não é surda
as gotas escorrem pela telha
o sangue pelas veias de quem vive
e quem não vive é paisagem
todo mundo quer viver e não sabe como
o inferno é o outro
ou é a gente mesmo e os outros não ajudam
não adianta…
parece que melhora, mas cansa
não há confiança que não se traia
os olhos desviam da respiração intermitente
do casal que não fala
e que mente expirando
o que sente e não traga
tem um corpo boiando no rio
a nuvem de medo distante
é roxa e preta e azul da cor da noite
o sangue vermelho no rio é da cor do sinal
uma luz forte em sua fronte
desce do carro
respira o sereno
tem uma mulher e uma criança em casa
o inferno é o cheiro de gasolina do carro velho
ou é viver sabendo que vamos todos morrer?
a luz do farol é verde
violentamente verde em sua paciência
o corpo dói mas se aguenta
a criança é muda e chora
rasga o céu em um grito amargo
tudo é dor e tudo é silêncio
a sensação é de que não passa