A lógica racional manifesta-se pela... Gustave Lebon
A lógica racional manifesta-se pela associação, mediante a reflexão e de acordo com o mecanismo precedentemente indicado de representações mentais ou de palavras que as traduzam.
Ela foi considerada durante muito tempo como base das nossas crenças. Admitimos, ao contrário, que a lógica racional não suscitou nenhuma crença. O seu único papel possível consiste em abalá-las.
Mas, se o papel da lógica racional é nulo na gênese da crença, é, ao contrário, capital na constituição do conhecimento. Todo o edifício das ciências e o colossal desenvolvimento da indústria moderna, que é a sua conseqüência, repousam nela.
Não se poderia, pois, exagerar a sua força; cumpre, no entanto, saber reconhecer também os limites que ela ainda não ultrapassou.
Os fenômenos da vida e do pensamento sempre se lhe mantêm fechados. O seu domínio é o da matéria bruta, isto é, momentaneamente estabilizada pela morte ou pelo tempo. Sobre os fenômenos que representam um movimento constante, como a vida, ela projetou luzes muito incertas.
Reinando a ciência, visivelmente sem rival no domínio do conhecimento, durante muito tempo se supôs que a lógica intelectual, de que ela deriva, serviria para explicar a gênese e a evolução das crenças.
Porém, os seres atuam antes de raciocinar e compreender e são, por conseguinte, guiados nos seus atos por outras formas de lógica.
Compenetrado dessa evidência reconhece-se que a lógica racional desempenha um papel bastante secundário na vida dos indivíduos e dos povos.
Não é necessário raciocinar para agir, e menos ainda compreender. O mais modesto inseto atua como deve, sem se preocupar com a nossa lógica.
A compreensão e a razão são formas da atividade dos seres inteiramente independentes da ação. Elas não fazem mais do que obstá-la, mostrando em demasia os seus perigos.
Graças às suas impulsões afetivas e místicas, os homens mais vulgares podem agir sem que tenham a menor suspeita quanto à origem dos seus atos. É inútil tentar com eles o emprego de argumentos de ordem intelectual. Em conseqüência da sua diminuta faculdade de compreensão, eles lotam um desprezo categórico a tudo quanto é superior à sua inteligência. Querer incutir-lhes no espírito certas idéias racionais seria imitar a criança que procura introduzir uma laranja num dedal. Cumpre saber medir a capacidade, geralmente restrita, do cérebro dos indivíduos e dos povos, antes de tentar introduzir nele algumas verdades racionais.
O papel da lógica racional no governo dos povos foi sempre muito fraco e somente se manifesta nos discursos. Não é, a razão, porém o sentimento que os comove e, por conseguinte, que os conduz.
Para mover, cumpre comover.
Na luta entre a lógica racional e a lógica afetiva, a primeira é quase sempre vencida.
Está longe o momento em que o mundo será conquistado pelo raciocínio filosófico. Ele tem sido sempre, ao contrário, até aqui, perturbado por crenças que a lógica racional desdenha, mas que não pode absolutamente combater.
Gustave Lebon - As Opiniões e as Crenças