AETERNUM O dia virá em que a linha,... Henrique - Et Letera

AETERNUM



O dia virá em que a linha, como uma risada interrompida,
ficará inconclusa. Por escrever.
Mas nesse dia nada ficará diferente.
Não mudará o espaço, que continuará vago
-como sempre o estará o espaço dos poetas, disponível-
e que, apesar disso, continuará a estar cheio,
porque jamais poderia estar doutra forma
aquilo que a própria ausência enche e enuncia.


E o que sobrar na memória dos outros,
capaz de merecer uma citação concreta, reproduzível,
uma frase lapidar que ilustre bem uma situação,
ou que claramente aponte um norte,
será tão importante quanto esse espaço de ser imutável,
que nada jamais alterou, a que nada dará fim
e que nenhum fim terminará.


E se nada chegar a esse ponto,
de mudar aos olhos dos outros;
se houver apenas uma vaga sensação de falta,
de coisa indefinível que o quotidiano crú apagará,
haverá ainda a memória daqueles que um dia,
pelo breve tempo encantado de um poema,
voaram mais alto e viram o mundo com outros olhos
-e souberam que ser Poeta é ter uma outra voz,
e sentir sob uma outra forma de consciência.
Que é imortal, mesmo no silêncio.