Sentido Não há mistério em existir... André Díspore Cancian

Sentido

Não há mistério em existir
Nem em viver ou sonhar
Caminhar se faz por si
Sem erros nem acertos
No acaso de cada passo

Mas quanto do insondável
Abraça a alma se desanda
[e olvida
E em seguida se procura
[por sentido
E naquilo que encontra
Quanto mais do impossível
Então se abriga nesta miopia

Preso na teia do sentido
Naquilo que mente do início
No que deveria ter esquecido
[de ter inventado
Noutro infeliz descuido
[de otimismo

Agora me refugio
Olhando tudo ao lado
Acima e abaixo
E repetindo
Fui vivo
Fui assim
Eu lembro
Que esqueço
E me perco
De novo a caminhar
À frente sem rumo
Olhando para trás
Vivendo a cãibra
De sempre se retorcer
E nunca se encontrar
Em qualquer direção
Em qualquer tempo
Ou na posição
De descansar
Do engano
De buscar
Algum alento
No desespero
Da mesma história
De quem deu um passo
[certo
E não pode apagá-lo
E não vê mais sentido
Em continuar em círculos
A fugir do próprio vácuo

Procuro alguma outra quimera
Pouco menos mesquinha
Somente algo pequeno
Que caiba no dia-a-dia
De uma vida abortada
Que perdeu os passos
[e a paciência
Enquanto contava
Os dias e as horas
De uma morte atrasada

Algo que já tenha desistido
De um caminho novo
Algo já cansado
[vencido
Por si mesmo
Destemido
Do erro

Procuro e encontro
Outro atalho para onde vivo
[perdido
Entre certezas e restos
E a minha solidão
E o meu abrigo
Que não é lar
Nem meu amigo
Mas sabe calar
Quando todo som
[é ruído
E todo sonho é ruína
E por hora só isso basta
E por hora nada peço da vida
Só por saber que acaba tão cega
[como se inicia