___________Queres escrever um poema... Emílio Miranda
___________Queres escrever um poema bonito?
______ Não invente: Escreva sobre as tuas misérias e as qualidades que adivinhas quando entrevês o teu rosto no espelho da memória. Evita todos os outros espelhos.
São apenas ilusão. Fala do que conheces e do desconhecido de ti… Inventa com verdade, pois mais do que inventares adivinhas…
Ninguém verdadeiramente sabe quem seja, mas todos anseiam a clarividência de sabê-lo. Não te deixes tentar por essa ilusão. Se procuras a verdade, procura com convicção, mas sem convencimento… Quem se convence engana-se duas vezes…
És o maior desconhecido que conheces… Tudo em ti é sempre um outro desejo de ver-te ou uma recusa permanente…
Porque a vida (in) felizmente, nem sempre é como desejas, nem sempre a aceitas ou agradeces como devias… Porque a vida é sempre realização… nunca um equívoco… apesar de ocorrerem muitos equívocos enquanto vives… Mas os equívocos existem apenas em ti… nas tuas concessões, nas tuas ilusórias visões… apenas aí… Tudo o mais é concreto…
A morte é o mais irreal que (des) conheces… trata-se de um futuro que nunca viverás…
Por isso, enquanto puder é sensato afirmar desconhecer a morte… Até prova em contrário sou imortal…
Às vezes pergunto-me se um dia saberei fazer melhor do que hoje… e concluo sempre que hoje sabemos sempre fazer o melhor…
Jamais alguém se sente tão vivo, como quando julga que sofre… como quando julga que perde… mas nada se perde… apenas se soma horas e dias e lembranças… O mais são coleções de bugigangas… objetos que se guardam em casa, como se fossem mais do que são… como se fossem tesouros e não pedaços de pó em formas de ilusão…
Sou rico porque quero… porque acredito… sou rico porque estou vivo… porque enquanto vivo sou imortal… e depois, o que importa o que fui… o que não fui ou o que desejei em vão?
Ninguém verdadeiramente é livre, ninguém realmente deseja sê-lo: o que todos desejam é a convicção de o serem…
Ninguém vive imune aos próprios erros… ninguém é superior aos males que causa à sua volta… quando ouvires alguém dizer que dorme sobre os próprios erros como sobre um colchão de penas… acredita que confunde penas com espinhos…
Queres escrever um poema bonito? Vive com beleza… Trata bem a vida… Para que possas olhá-la de frente quando falares dela…
Tudo o que disseres de esguelha será (a) percebido…
Não mintas que a ti mentes… Ninguém mente apenas aos outros… A tua mentira é o que és… É assim que serás visto… pelos olhos que recusas possuir… pelos olhos com que (te) recusas ver.