"Por mais sem sentido que fosse, eu... Amanda Seguezzi
"Por mais sem sentido que fosse, eu simpatizava muito com a ideologia de esconder-se num mundo irreal e imaginário. Nele eu invento. Sou rainha, dama da noite, a peça que se encaixa em todos os quebra-cabeças. Nele eu te moldo. Reestruturo tua sensibilidade e altero o status da tua liberdade. Nesse mundo perfeito, viajamos através das cores do arco-íris e Sofrimento é o nome de um reino distante. Aquela valsa só não é mais bonita que o pôr do sol refletindo a cor do teu olho, aquele sol não é tão mais puro quanto o sossego entorpecente que tua presença me traz. Entretanto nunca saberás deste lugar. Não correrás comigo na chuva de algodão e não saberás que as flores do campo se abrem devido ao teu sorriso e não por culpa da primavera. Neste espaço, te esculpo em mil faces, mil trejeitos. Te sequestro de mil maneiras, te roubo, me envolvo precipitadamente, contudo não me precipito em querer-te tanto só pra mim. Ficas perdido em meus labirintos, na trama dos meus cabelos e nas curvas do meu corpo.
Apenas te perco quando desperto. Meus dedos sempre dançam nas teclas da máquina de escrever, enquanto te desenho com minhas palavras. A realidade é perturbadora, assim como aquela saudadezinha que bate na janela de madrugada de vez em quando. Eu não me adaptava a isso tudo, só assim eu pudera perceber que as ilusões escaparam pelas frestas do pensamento e assumiram um papel real. Era engraçado como eu amava sozinha. Era engraçado alimentar um animal sedento por afeto, atribuindo qualquer pequeno gesto como um sinal de esperança serena. Realidade é olhar para uma estrela cadente e querer desejar qualquer coisa, no entanto sempre acabar comparando o sorriso dele com o brilho de uma constelação. Inevitável não pensar. É dançar conforme uma música desregulada onde sabes que os passos estão errados, mas sabes que não se pode modificá-la ou trocar o disco por não seres tu o ser dominante. Queria reviver aquele ensejo onde não precisava visitar esse mundo paralelo com frequência para sentir teu semblante, aquela ocasião onde eu não precisava decorar o teu cheiro e lembrá-lo todo dia, pois eu podia senti-lo a cada madrugada quando estavas ao meu lado. Ah que frenesi. Te desfaz nos meus braços de novo e me mostra que o infinito é quando nossas almas entram em sintonia e se reconhecem. Infinito era aquela tatuagem discreta no antebraço que ele possuía. Era como eu definia aquele pequeno instante que passava mais que depressa. Era como se perder num universo colateral e não se importar se a eternidade perpetuasse. Era veracidade e virou quimera. Era exatidão e transformou-se em teorias impraticáveis. Aquilo que existe de fato nunca fora bem-vindo, converteu-se em infortúnios cercados de linhas cruzadas e reviravoltas inimagináveis. Quem diria que trazendo nosso mundo à baixo eu conseguiria sorrir amarelo para as possibilidades reais da vida? Mas é assim mesmo, ninguém se alimenta de presenças e lembranças não te fazem respirar. Não tem volta e eu já me conformei. Faço do teu silêncio um argumento e da tua ausência um contrato com o sossego, enfim."