Carta ao passado Nesta carta que nunca... Lucas Martins Lisboa
Carta ao passado
Nesta carta que nunca irás ler, coloco palavras que nunca disse, hei-de correr o risco de perder-me entre tantos pensamentos e sentimentos absolutamente distintos. Irás nela perceber minhas inúmeras mudanças de humor, assim como uma mudança não menos que radical da minha percepção dos fatos.
Após longa e frustrada espera, sem receber nenhuma linha tua, penso eu que seja a hora de escrever-te.
Quero que percebas que não ponho nessa carta amargura, nem quero que te sintas culpado muito menos que tenhas arrependimento. Não estou intencionado a pôr angústia em teu coração, mas sim tirar do meu.
Minha vaidade é grande e impede-me de admitir que o tempo de nada serviu-me, se não para aumentar ainda mais as dúvidas que em mim profundam desde o dia em que me deixaste. Por ser orgulhoso eu nego; se ainda penso nas coisas que fazíamos e na forma que tratavas-me. Eu minto quando questionado se procuro em outros amantes tuas qualidades e se faço avaliações dos futuros pretendentes de acordo com os teus juízos.
Sou orgulhoso demais para assumir que sentia tua falta mas por necessidade aceitar-te ia caso quisesses voltar.
Durante esses anos eu esperei, naturalmente, para ouvir tuas desculpas, e para ver de que forma ias apresentá-las, mesmo sabendo que invariavelmente, fazendo tu o que fizesses, perdoar-te ia.Nada aconteceu, se não minha infrutífera espera…
E, então a dor tomou-me por completo, dor de pensar que talvez quem tenha se afastado tenha sido eu, por uma escolha errada, em defesa de uma certeza equivocada, que talvez eu tenha fugido e que tu apenas respeitaste minha fuga, a me deixares fugir.
Acreditava que a vaidade era uma flor graciosa que podia adornar-me, sendo assim não te procurei, não sofri, não chorei, nem ao menos pedi a intervenção dos teus amigos para que tu voltasses, pois acreditava que nada disso seria necessário, pois no tempo certo tu perceberias que nada daquilo fazia sentido e voltarias.
Não voltou e sinceramente não desejo que um dia voltes. As vezes imagino como seria se voltasses hoje, crio incontáveis histórias na minha cabeça e chego a conclusão que seria um estrago tamanho, só serviria para fazer-me acreditar que tudo havia sido um engano e que essas duas pessoas, jamais se conheceram.
Hoje contento-me apenas em ser nostálgico e, percebo que tu foste e continuas sendo minha referência afetiva mais sincera e profunda, mas não quero e nem vou viver esse amor sozinho, de platônicos já me bastam os sonhos.
Neste momento coloco o ponto final em minha fracassada espera, já não quero saber de reticências, elas me fazem acreditar num futuro que está preso ao passado e me fazem deixar de viver o hoje.
Saudades é o que deixaste.
Espero que essa saudade um dia se canse de mim, da mesma forma que eu me cansei dela.
Com amor,
Lucas.