Idiossincrasias A forma como visto meu... Idenir Ramos

Idiossincrasias

A forma como visto meu sapato
como sempre prefiro um casaco preto
o jeans surrado, sempre o mais confortável
as músicas que fazem minha cabeça
e me fazem sorrir já pelo amanhecer
os fones sempre nos ouvidos
uma batida compassada
uma guitarra arrebatadora
uma voz altissonante
meu cabelo desgrenhado - minha vaidade

As frases impactantes
que tenho sempre na ponta da língua
as ruas por onde andei e sempre retorno
as arvores que admiro e desenho
a sombra projetada pelo vôo do pássaro
sobre as pedras - a sombra que eu queria poder pintar num quadro com cuidado e elegância

Meu cérebro, meu intelecto
as memórias que retenho e sempre visito
dia após dia beijo a boca das mulheres
que amei um dia
uma a uma, beijo sobre beijo, beijo e mais beijo, infinitas camadas sobrepostas de beijos
Céus como eu amo os lábios femininos!
as palavras que elas usam para me ferir
ou me conquistar ainda mais
a forma como conseguem tudo de mim
com apenas um toque ou um olhar meigo

A curva do amanhã, o horizonte resplandecendo
a sepultura que jamais me assusta
meu epitáfio já escrito e corrigido
a esperança - minha mão sendo segurada no escuro pela fé

As brigas e as discussões com meu pai
as brigas um pouco mais suaves com a minha mãe
as brigas com meus irmãos e amigos
o arrependimento instantes depois

As palavras que li nos livros
dos clássicos aos best sellers
a ordem enlouquecedora das palavras no dicionário
os poemas, eternos poemas
de todos os grandes poetas

Meus passos sorrateiros pelas avenidas da morte
- sou amigo do abismo a tempos
meus vicios, minhas loucuras
minha vida enigmática
como um conto de Jorge Luis Borges

Minha vontade de escrever sem parar
rasgando a carcaça do tempo
cuspindo sobre tudo que se diz beleza e não é

Eu, minhas idiossincrasias
meu modo de pensar e agir
de repensar e desistir ou prosseguir

Minhas indagações filosóficas e teológicas
meu estoicismo misturado com epicurismo
meu cristianismo livre, solto, despojado
minha profunda admiração pelo eclesiastes

Meus dias cinzentos, azuis
as manhas cheias de sol e sentio
as tardes sempre sonolentas
as noites sedutoras, enluaradas

O perfume das primeiras flores da primavera
a possibilidade de visitar a praia no verão
o outono camaleônico e amarelecido
a pressa de me abrigar do frio do inverno - a gripe

Novamente a presença da morte
e do amor
binomia que me intriga
o que é melhor inexistir ou amar e ser amado?
na morte não existe sofrimento
no amor o sofrimento é presença constante
não amar é não viver

Não disse tudo, sempre fica algo por dizer
que se dane! Tudo é devaneio, palimpsesto de sonhos, pesadelos, delírios.