Palavras e seus poderes Sempre fui... Renata Moreira
Palavras e seus poderes
Sempre fui encantada pelas palavras e pelo poder que elas carregam. Lembro-me, por volta dos quatro anos de idade, indagar minha mãe por que amarelo chamava-se amarelo... Queria entender o porquê não poderia ter outro nome. Quem teria dito que amarelo seria (e para sempre) o nome daquela cor? Vim entender mais tarde que essa e tantas outras questões eram frutos de convenções linguísticas e sociais. Essa compreensão, entretanto, não aplacou meus questionamentos. Continuei perguntando e tentando encontrar – não as respostas – as explicações. Inquietavam-me (como ainda continuam inquietando) as descrições como as coisas são ou como deveriam ser. Penso hoje que foi assim que cheguei à Psicologia, que escolhi ir para o Mestrado e que ainda continuo buscando compreender as coisas e a realidade que me cerca. Permaneço querendo entender os significados, os sentidos, as motivações no uso das palavras.
Muita gente diz que o que importa não é o que se diz, mas como se diz tal coisa. Pode ser. Minhas inúmeras questões têm me feito atentar para o que e com que termos dizemos as coisas que dizemos. Porque para cada “simples” palavra há um mundo complexo de possibilidades. Palavras carregam histórias, sentimentos, preconceitos, crenças, valores, intenções. E por isso, as constantes lutas existentes pelas mudanças nas terminologias que utilizamos, uma vez que “retardado” é diferente de “pessoa com deficiência”; “veado” de “homossexual”, “aidético” de “pessoa com HIV”...
Essa semana a Avenida Paulista foi notícia mundial. E acompanhamos todos, senão as notícias, as histórias sobre as mesmas. Eu, apaixonada pelas palavras, acompanhei os termos empregados nessas divulgações e, depois, nas manifestações dos que apoiavam ou criticavam o movimento. Não entrarei aqui no mérito ou não das formas como foram feitas as manifestações contra o aumento da tarifa do ônibus, contra a copa, a corrupção ou qualquer outra motivação que tenha sido atribuída aos movimentos. Mas no incômodo que senti, uma vez mais, com o que e como foram divulgados os acontecimentos. Em como eles são todos os dias, seja nos veículos locais ou nacionalmente falando. No incômodo com a escolha das palavras, no modo como as notícias são divulgadas e “vendidas” por meio de termos impactantes e sensacionalistas para que assim possam mais do que atingir o público; serem vistas de modo exclusivo e compradas como donas de uma única verdade, tornando-se inquestionáveis.
Pois como eu disse, palavras carregam histórias, sentimentos, preconceitos, crenças, valores, intenções. E também acredito, que “às vezes um charuto é apenas um charuto” como dizem ter colocado Freud. Sim, às vezes podemos utilizar as palavras sem o processo da escolha, sem a noção do mundo que elas carregam em si e podemos dizer “preto” sem nenhum tipo de intenção ou preconceito por trás. Sim, às vezes. Mas também acredito que, cientes da capacidade das palavras, é recomendável cuidado ao empregá-las.
Eu também disse que muita gente diz que o que importa não é o que se diz, mas como se diz. Há aqueles que dizem que o que importa mesmo não é o que se diz ou como se diz, mas o que se faz. Eu sigo analisando o que as pessoas dizem e com isso, o que elas fazem. E cada vez mais atenta às imagens, palavras e expressões... Pois eu acredito que as palavras têm poder e elas mais do que falam, fazem coisas. Porque mais do que produto de um processo histórico as palavras também constroem a história.