Era uma vez um menino, assim como... Mirian Machado Mendes
Era uma vez um menino, assim como centenas de outros meninos. De tanto observar as pessoas e ler livros tomou medo do mundo e da vida.
Entretanto, como as necessidades cotidianas o faziam sair de sua casa decidiu que ia se refugiar dentro de uma caixa. Tentou impermeabiliza-la, mas sem sucesso desistiu. Apesar disso, dentro da caixa ainda havia proteção, segurança e conforto suficientes.
Para cada ocasião o menino tinha uma caixa diferente. Cores variadas, estampas para dias ensolarados.
Era tudo perfeito, quando regressava ao seu lar ele saía da caixa, mas foi aos poucos se acostumando, afinal era mais prático ficar lá dentro. Aprisionado, porém seguro.
O tempo, inimigo dos mortais, passou e num dia qualquer ele viu uma menina de grandes pupilas escuras, que lhe olhou de soslaio e mesmo assim o enxergou dentro da caixa.
Como aqueles olhos eram enigmáticos para o menino. Ele quase perdeu o medo, ele quase se mostrou. Quase!
Depois disso ele experimentou uma inquietação violenta, que o fazia sufocar em seu quarto, a ponto de leva-lo a sair da caixa e se olhar no espelho. Pobre menino, tentava encontrar no reflexo o brilho dos olhos da pequena. O miserável menino, sentiu o coração bater forte quando não pode mais reconhecer sua imagem refletida.
Quem era aquela pessoa pálida que revelara o espelho?
Ele já não sabia mais. Voltou para a caixa e foi dormir.
Talvez seja esse o mito da caverna invertido e moderno.
Gente que se esconde em carapaças por tanto tempo que já não sabe mais quem é.