Sim, leitor benévolo, e por esta... Almeida Garret
Sim, leitor benévolo, e por esta ocasião vou te explicar como nós hoje em dia fazemos a nossa literatura. Já não me importa guardar segredo; depois desta desgraça não me importa já nada. Saberás pois, ó leitor, como nós outros fazemos o que te fazemos ler.
Trata-se de um romance, de um drama — cuidas que vamos estudar a história, a natureza, os monumentos, as pinturas, os sepulcros, os edifícios, as memórias da época? Não seja pateta, senhor leitor, nem cuide que nós o somos. Desenhar caracteres e situações do vivo na natureza, colori-los das cores verdadeiras da história... isso é trabalho difícil, longo, delicado, exige um estudo, um talento, e sobretudo um tato!...
Não senhor: a coisa faz-se muito mais facilmente. Eu lhe explico.
Todo o drama e todo o romance precisa de:
Uma ou duas damas.
Um pai.
Dois ou três filhos, de dezenove a trinta anos.
Um criado velho.
Um monstro, encarregado de fazer as maldades.
Vários tratantes, e algumas pessoas capazes para intermédios.