Capítulo 1 Há muito o sol dourado... mayara oliveira

Capítulo 1



Há muito o sol dourado ilumina os corações de pessoas que caminham para lá e para cá em suas tarefas incansáveis, homens que vão para os seus trabalhos, mulheres que dão ordens aos empregados, os filhos que vão para as escolas, a cidade também não descansa em hipótese alguma e desponta em seu burburinho contagiante que leva animação e o brio de determinação para os comerciantes, operários e trabalhadores de bem. As classes são divididas em altas, médias e baixas, nos anos 20 se “misturar” com uns e outros, era realidade que não existia e isso afetava de tal modo as relações humanas, na verdade, afeta até os dias atuais. Ao longe, em uma casa de aristocratas, vivem Marta e sua filha única, chamada Laura, a mulher mais madura veio de uma família da alta nobreza e sua filha nasceu com luxo também, o marido e pai delas morreu a alguns anos, chamava-se Rui Alcântara Ferraz, mas este fato iremos relatar mais adiante. Só que mesmo acostumada com muito, Laura não se prende a bens materiais e sua mãe sabe muito bem disso, por conta dessa rebeldia, fato transgressor para aquela época, ela resolve pôr um ponto final nessa história e casá-la com Edgar Andrade e Couto, rapaz jovem e bem rico que está noivo dela, mas mesmo gostando dele, Laura não sente que achou o grande amor de sua vida e isso a deixa bem frustrada, talvez seja, pensa ela que por conta do dinheiro que sempre irá segui-los onde quer que vão, traindo os seus próprios sentimentos e afundando casamentos e relações ao mar de desesperos, mas quando será que isto irá mudar?.
Edgar chega naquela mesma manhã para visitar a noiva e sempre com muito aprumo, pàra na porta de seu casarão com um belo carro acompanhado de seu motorista particular, típico de homens vulgares que querem demonstrar poder e riqueza a qualquer custo, até mesmo para quem não tem muito e Laura sabia muito bem, até por que crescera ouvindo as conversas de seus pais com os pais de Edgar e sempre percebia o modo como Eulália e Edmundo Andrade e Couto tratavam com aspereza e superioridade os outros, com risadas estrambólicas e contando sobre as maravilhosas minas que têm em suas propriedades, aquilo sempre encheu demais os seus ouvidos. Edgar desceu de seu carro apenas quando seu motorista abriu a porta para ele, mais um detalhe que era muito esnobe, ela viu por que justamente naquele momento estava parada em pé na janela de seu quarto que fica na parte de cima da casa, reconheceu o som do carro vindo de longe, afirmando constantes visitas a sua casa, mas isto não significava para ela, amor, não, pelo menos ela acreditava que não, um dos motivos era a infindável bajulação a sua mãe, comportamentos normais... Para quem se importa com nomes e prestigio, de repente os seus pensamentos foram interrompidos por sua mãe que havia acabado de entrar em seu quarto sem bater a porta, mania terrível de Marta quando está em euforia, até parecia que o presidente estava vindo nos ver em mais uma de suas visitas rotineiras.

-minha querida, vejo que pela janela você já notou quem acaba de chegar, não foi? Diz Marta com muita entonação na voz.
-sim, vi sim, por quê?Algum problema? Fala Laura relapsa.
-nossa Laura, mas por que essa expressão de velório, meu amor trata-se do seu...
-eu sei que é o Edgar, mãe, fique tranquila, eu já vou descer, eu não preciso dar pulos de alegria pelos milhões de visitas que ele já nos fez esta semana, a senhora sabe bem disso.
-ora Laura, deixe de ser ingrata, ele vem por que quer te ver, sente saudades suas, e você deveria se sentir mais que lisonjeada de ser cortejada e em breve se casar com um membro da família Andrade e Couto, ah, quem dera eu tivesse essa sorte.
-pois então case-se a senhora com ele,- e falando isso, Laura dá as costas a mãe e se dirige a sala onde Edgar está.
Marta fica surpresa com a resposta da filha.
-mas olhe só como essa menina está ficando!.

Edgar adentra a sala do casarão, aberta por uma das centenas de empregadas e senta-se no sofá de couro legitimo com adornos de ouro e prata nas beiradas, tira o seu chapéu da cabeça e o descansa em cima da poltrona, fica bem a vontade como puderam perceber, impaciente como é, começa a coçar a cabeça em sinal de preocupação, mas logo Laura aparece e ele se vira para receber a noiva.
-ora Laura, meu amor, há quanto tempo não nos vemos, hein?-diz ele abraçando e tentando beijar a moça, mas que vira o rosto repentinamente.
-nem tanto tempo assim, não é Edgar?, Afinal, há três dias você estava sentado aqui mesmo conversando por mais de meia hora com mamãe, ou já se esqueceu?
Edgar demonstra surpresa com o seu comportamento esquivo e frio.
-bem, mais ou menos,eu passei esses três últimos dias ocupadíssimo com os negócios de papai que insiste para que eu o suceda imediatamente, sabe como é!.
-não,eu não sei,-fala Laura fria e virando-se para se sentar também.
Marta aparece na sala junto com uma serviçal que oferece sucos e tortas a Edgar.
-com licença, me perdoem, mas eu vou pedir uma licencinha para os pombinhos e fazer questão em oferecer uns comes e bebes ao nosso querido Edgar, - e virando-se para a criada, - ponha ali na mesinha perto dele, ande.
-não, não precisa mesmo dona Marta, eu já comi hoje mais cedo antes de sair de casa, não estou com fome, mas obrigado mesmo assim pela gentileza.
-ah, amor, não há de quê.
Laura nunca entendeu toda essa devoção que sua mãe demonstrava ter por Edgar, talvez ela agisse assim por que ele era “dos nossos”, expressão baixa e totalmente preconceituosa que ela falava aos quatro ventos com o maior orgulho ou então devido ao fato de que” um membro da família Andrade e Couto estava se unindo com a sua única filha”, ah,isso a perturbava tanto e só de pensar que com outros menos favorecidos, era uma brutalidade tão grande que chegava a assustá-la, definitivamente muita coisa estava fora do lugar.
-bem,eu na verdade só vim mesmo para levar Laura a um passeio comigo,eu trouxe o meu melhor carro que inclusive está ai fora a nossa espera para levarmos aonde quisermos, ou talvez, como Laura gosta tanto de arte, a alguns belos museus, o que acha querida?
Antes que Laura pudesse abrir a boca para falar qualquer coisa, talvez até antes que ela cogitasse em pensar alguma coisa, sua mãe já se adiantou como uma bala certeira.
-mas é obvio que ela vai com você Edgar!!
-mãe, mas o que é isso agora? Vai ficar controlando até as minhas falas, meus pensamentos, o que eu acho o que eu quero?
-me desculpe amor, eu não imaginava que você quisesse ficar em casa hoje, é que o dia está tão lindo lá fora, tão propicio para um passeio...
-ao ar livre.
-o quê?-perguntam chocados Marta e Edgar ao mesmo tempo.
-é isso mesmo o que ouviram, eu aceito de bom grado sair com o Edgar se for um passeio ao ar livre, como você mesmo disse o dia está lindo, o sol muito brilhante no céu e eu adoraria respirar um pouco de ar puro, por que se você me permite uma observação, eu acho esse seu carro muito pavoroso, me dá até um pouco de medo, muito escuro, muito fechado, morreria asfixiada, me entende?,- diz Laura com certa ironia.
Edgar e Marta se entreolham.
Marta tenta apaziguar a terrível situação.
-Laura, minha querida, o Edgar veio com este carro dele por que ele simplesmente quer que você passeie um pouco com ele, o faça companhia, e o motorista está até ai fora também, vai ser uma recusa tremenda por parte dos dois.
-ora mamãe, e desde quando agora a senhora se importa com os empregados?
-Laura, não me irrite, por favor.
-não, tudo bem,deixa,deixa, eu aceito Laura, aceito o que quer então, vamos passear um pouco a pé mesmo,eu vou deixar o Antony aqui na porta da casa de vocês, e quando voltarmos,eu sigo com ele no meu carro até em casa, não tem problema, deixamos o passeio de carro para outra ocasião.
-ótimo, eu vou pegar a minha bolsa, um instante,-diz Laura sorridente, mas quando ela passa por sua mãe, Marta lhe lança um olhar fuzilante que deixaria qualquer um assustado, mas ela não se amedronta, apenas a encara e segue para o seu quarto.