Acordo tarde, me lastimando por esse... Heidi Georg

Acordo tarde, me lastimando por esse deslize.
Tantas coisas para resolver!
É domingo, e a chuva se insinua em pingos escassos que deslizam pela vidraça.
Penso nos transtornos que ela me trará, um dia de sol seria bem mais proveitoso.
Enquanto preparo o café do meu filho, faço uma retrospectiva da semana e planejo minhas ações: Tenho contas a pagar, pendências a resolver, armários a arrumar, trabalhos acumulados e vários outros desafios pela frente.
Sinto-me só e fraca, estou desanimada.
Finalmente enfrento a chuva e o passeio matinal com o cão.
Paro no caixa eletrônico, preciso de dinheiro. Meu filho terá aula extra de matemática.
Mais à frente, o mercadinho. Bananas e uvas para o café da manhã.
Dou a volta na quadra enquanto a chuva aperta.
Penso na semana que está por vir e o desânimo persiste.
Ao cruzar o posto de gasolina, me deparo com uma pessoa que dorme em cima de um papelão sob a árvore.
É um homem ainda muito jovem.
À sua volta, uma porção de chão ainda seco.
Sobre o corpo, uma coberta suja e fina.
Tento adivinhar os motivos desse abandono, da vida fútil e oca desse quase menino.
Tento projetar em mim mesma o vazio do seu estômago e da sua mente ao despertar.
Atravesso a rua e recebo na pele, como uma bênção, a chuva que refresca finalmente as árvores.
Penso nas contas que serão pagas, nos armários cheios de roupas e sapatos a organizar.
E me vem uma nova ideia para dividir amanhã com a equipe.
Afago meu cão saudável, vejo meu filho navegando na internet e se divertindo com um filme em inglês.
Não estou mais só, sou envolvida por um sopro divino.
Tudo agora é luz, sinto-me plena.