Mas para Zeca, para sua alma eternamente... Lúcio Cardoso
Mas para Zeca, para sua alma eternamente imatura, alguma coisa acabara de suceder, e era tão grave, tão decisiva como se lhe fosse outorgada uma maturidade postiça, e ele, a quem a infância fôra dada como destino, viesse bruscamente a perceber o equilíbrio e o tempo, pois o que sentira, mais do que vira ou percebera, fôra uma emoção fund
a e desgarradora, uma certeza sem palavra, sem nome, sem classificação, sem nada que pudesse admití-la ou revelá-la, de que a vida existia - essa coisa infrene, cega, voluptuosa e azul, que do outro lado, com um poder sobrenatural erguia a paisagem e a sustinha em seus luminosos alicerces. Descobrindo a vida, Zeca ao mesmo tempo descobrira a si mesmo e aos outros - e tudo o que ele não identificara durante aquele tempo, Donana, o homem ensanguentado, a cortina, as vozes, aquela flor que sustinha na mão - tudo, todas essas realidades - rapidamente encaminharam-se para seus lugares, ocuparam os nichos vazios, deram consistência, cor e veracidade ao mundo. E descobrindo tudo isto, Zeca havia descoberto a morte.