Flor

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Morena Flor

Ela tem uma graça de pantera
No andar bem-comportado de menina.
No molejo em que vem sempre se espera
Que de repente ela lhe salte em cima

A mim me enerva o ardor com que ela vibra

E que a motiva desde de manhã.
- Como é que pode, digo-me com espanto...

Escolha


Eu te amo como um colibri resistente
incansável beija-flor que sou
batedora renitente de asas
viciada no mel que me dás depois que atravesso o deserto.
Pingas na minha boca umas gotas poucas
do que nem é uma vacina.
Eu uma mulher, uma ave, uma menina…
Assim chacinas o meu tempo de eremita:
quebras a bengala onde me apoiei, rasgas minhas meias
as que vestiram meus pés
quando caminhei as areias.

Eu te amo como quem esquece tudo
diante de um beijo:
as inúmeras horas desbeijadas
os terríveis desabraços
os dolorosos desencaixes
que meu corpo sofreu longe do seu.
Elejo sempre o encontro
Ele é o ponto do crochê.
Penélope invertida
nada começo de novo
nada desmancho
nada volto

Teço um novo tecido de amor eterno
a cada olhar seu de afeto
não ligo para nada que doeu.
Só para o que deixou de doer tenho olhos.
Cega do infortúnio
pesco os peixes dos nossos encaixes
pesco as gozadas
as confissões de amor
as palavras fundas de prazer
as esculturas astecas que nos fixam
na história dos dias

Eu te amo.
De todos os nossos montes
fico com as encostas
De todas as nossas indagações
fico com as respostas
De todas as nossas destilairias
fico com as alegrias
De todos os nossos natais
fico com as bonecas
De todos os nossos cardumes
as moquecas.

A flor e a náusea

Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.
É feia. Mas é flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.

Chego a mudar de calçada
Quando aparece uma flor
E dou risada do grande amor...

A flor e seu nome

Mas o que impressiona mesmo no amor-perfeito é o nome. Que responsabilidade, meu filho! Há por aí uma planta chamada de amor-de-um-dia, que não carece muito esforço para ser e acontecer, como doidivanas. Outra atende por amor-das-onze-horas e presume-se como sua vida é folgada. Há também amor-de-vaqueiro, amor-de-hortelão, amor-de-moça, amor-de-negro... muitos amores vegetais que desempenham função limitada. Mas este aqui não tem área específica, não se dirige a grupo, ocasião, profissão. É absoluto, resume um ideal que vai além do poder das flores e dos seres humanos.
Que sentirá o amor-perfeito, sabendo-se assim nomeado? Que tristeza lhe transfixará o veludo das pétalas , ao sentir que os homens que tal apelação lhe dera não são absolutamente perfeitos em seus amores? Que aquele substantivo, casado a este adjetivo, sugere mais aspiração infrutífera da alma do que modelo identificável no cotidiano?
A tais perguntas o sóbrio amor-perfeito não responde. O outono tampouco. Talvez seja melhor não haver resposta.

Fez-se uma pausa no tempo, cessou todo meu pensamento, e como acontece uma flor também acontece o amor...Assim, sucedeu e foi tão de repente que a cabeca da gente vira só coracão..

Como uma jovem rosa, a minha amada...
Morena, linda, esgalga, penumbrosa
Parece a flor colhida, ainda orvalhada
Justo no instante de tornar-se rosa.

Ah, porque não a deixas intocada
Poeta, tu que es pai, na misteriosa
Fragrância do seu ser, feito de cada
Coisa tão frágil que perfaz a rosa...

Mas (diz-me a Voz) por que deixá-la em haste
Agora que ela é rosa comovida
De ser na tua vida o que buscaste

Tão dolorosamente pela vida ?
Ela é rosa, poeta... assim se chama...
Sente bem seu perfume... Ela te ama...

Meu amor, minha flor, minha menina
Solidão não cura com aspirina

Zeca Baleiro

Nota: Trecho da música Meu amor, minha flor, minha menina.

TIVESSES TU NASCIDO UMA FLOR

Tivesses tu nascido uma flor
Serias, sim, como as flores do campo.
Tivesses tu nascido uma flor
Os jardins seriam mais belos!

Como uma canção de amor,
pelo ar, a fluir,
a Alegria não teria sorriso tão lindo assim:
o sorriso mais simples
e o mais encantador!

Tivesses tu nascido uma flor
- não é nenhum exagero -
Tivesses tu nascido uma flor
o mundo teria muito mais cores!

Por que tudo em você inspira poesia
e a própria Poesia se inspiraria em você
E a vida inteira seria o mais doce sonho
se tivesses tu nascido uma flor...

Tivesses tu nascido uma flor
Serias tu o próprio Encanto
Serias mais que tudo que há de belo...
Por que, minha querida, tudo em você é incrível!

Tivesses tu nascido uma flor
serias, sim, como as flores do campo:
As mais humildes,
as mais inebriantes,
e as mais belas!
- E serias, ainda, a flor mais linda do mundo!

Sou tímido e sensível à flor da pele, no palco é a hora de vomitar.

Hoje à noite
até as estrelas
cheiram a flor de laranjeira

Enfrentei o terror da morte e, transpondo-o, encontrei a flor da vida.

O beija-flor passa de jardim em jardim beijando rosas,
mas como as rosas não lhe beijam de volta,
ele parte, vai embora.
No dia que o beija-flor encontra uma rosa
que lhe beija de volta,
ele também parte, vai embora,
mas sempre volta,
ah, sempre volta...

SONHOS DE MENINA

A flor com que a menina sonha
esta no sonho?
ou na fronha?
A lua com que a menina sonha
é o lindo do sonho
ou a lua da fronha?

Eu protegi o teu nome por amor
Em um codinome, Beija-flor
Não responda nunca, meu amor
Pra qualquer um na rua, Beija-flor

Quando acende o lampião, é como se fizesse nascer mais uma estrela, mais uma flor. Quando o apaga, porém, é estrela ou flor que adormecem. É uma ocupação bonita. E é útil, porque é bonita.

Onde estivestes de noite
Que de manhã regressais
com o ultramundo nas veias,
entre flores abissais?

O meu mundo não é como o dos outros, quero demais, exijo demais; há em mim uma sede de infinito, uma angústia constante que eu nem mesma compreendo, pois estou longe de ser uma pessimista; sou antes uma exaltada, com uma alma intensa, violenta, atormentada, uma alma que não se sente bem onde está, que tem saudade… sei lá de quê!

Florbela Espanca
Cartas a Guido Battelli

Passa uma Borboleta

Passa uma borboleta por diante de mim
E pela primeira vez no Universo eu reparo
Que as borboletas não têm cor nem movimento,
Assim como as flores não têm perfume nem cor.
A cor é que tem cor nas asas da borboleta,
No movimento da borboleta o movimento é que se move,
O perfume é que tem perfume no perfume da flor.
A borboleta é apenas borboleta
E a flor é apenas flor.

Alberto Caeiro
PESSOA, F. O Guardador de Rebanhos, In Poemas de Alberto Caeiro. Lisboa: Ática. 1946 (10ª ed. 1993). p. 64
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Sol no girassol.
Sombra desenha outra flor
no corpo dourado.