Filho
Que a gente possa ser mais irmão, mais amigo, mais filho e mais pai ou mãe, mais humano, mais simples, mais desejoso de ser e fazer feliz.
Vou querer namorar? Não. Vou querer casar? Não. Vou querer pra pai dos filhos? Não. Então deixa pra lá que já tô velha pra essa palhaçada.
Eu nunca mais quero ouvir que você só tem olhos pra mim, ok? E nem o quanto você é bom filho. Muito menos o quanto você ama crianças. E trate de parar com essa mania horrível de largar seus amigos quando eu ligo. Colabora, pô. Tá tão fácil me ganhar, basta fazer tudo pra me perder.
“Bendito aquele que consegue dar aos seus filhos asas e raízes”, diz um provérbio.
Precisamos das raízes: existe um lugar no mundo onde nascemos, aprendemos uma língua, descobrimos como nossos antepassados superavam seus problemas. Em um dado momento, passamos a ser responsáveis por este lugar.
Precisamos das asas. Elas nos mostram os horizontes sem fim da imaginação, nos levam até nossos sonhos, nos conduzem a lugares distantes. São as asas que nos permitem conhecer as raízes de nossos semelhantes, e aprender com eles.
Bendito quem tem asas e raízes. E pobre de quem tem apenas um dos dois.
As crianças chatas
Não posso. Não posso pensar na cena que visualizei e que é real. O filho que está de noite com dor de fome e diz para a mãe: estou com fome, mamãe. Ela responde com doçura: dorme. Ele diz: mas estou com fome. Ela insiste: durma. Ele diz: não posso, estou com fome. Ela repete exasperada: durma. Ele insiste. Ela grita com dor: durma, seu chato! Os dois ficam em silêncio no escuro, imóveis. Será que ele está dormindo? - pensa ela toda acordada. E ele está amedrontado demais para se queixar. Na noite negra os dois estão despertos. Até que, de dor e cansaço, ambos cochilam, no ninho da resignação. E eu não aguento a resignação. Ah, como devoro com fome e prazer a revolta.
Todas as coisas da criação são filhos do Pai e irmãos do homem... Deus quer que ajudemos aos animais, se necessitam de ajuda. Toda criatura em desgraça tem o mesmo direito a ser protegida.
Soneto
Ao meu primeiro filho nascido morto com 7 meses incompletos. 2 fevereiro 1911.
Agregado infeliz de sangue e cal,
Fruto rubro de carne agonizante,
Filho da grande força fecundante
De minha brônzea trama neuronial,
Que poder embriológico fatal
Destruiu, com a sinergia de um gigante,
Em tua morfogênese de infante,
A minha morfogênese ancestral?!
Porção de minha plásmica substância,
Em que lugar irás passar a infância,
Tragicamente anônimo, a feder?!...
Ah! Possas tu dormir, feto esquecido,
Panteísticamente dissolvido
Na noumenalidade do NÃO SER!
Prepare seu filho para "ser", pois o mundo o preparará para "ter".
Declare a seus filhos que eles não estão no rodapé de sua vida, mas nas páginas centrais da sua história.
Casada, três filhos, arquiteta
não foi vista tomando um campari
na companhia de um turista alemão
Senhor respeitável, discreto, comprometido
não foi apanhado em flagrante
com uma morena gostosa sem sutiã
Filha de deputado, 17 anos, namorado firme
não foi surpreendida nos braços de outro
quando deveria estar na aula de inglês
Senhora decente, viúva, cinquentona
não foi alvo de comentários
por hospedar na sua casa o marido de alguém
Fidelidade é não contar nada a ninguém
Pais e filhos vivem ilhados, raramente choram juntos e comentam sobre seus sonhos, mágoas, alegrias, frustrações.
Nosso Deus não é pai apenas nos bons momentos. Ele não entra nessa de "ame seus filhos e os abandone". Posso confiar que ele estará ao meu lado, por pior que eu seja. Você também pode.
Coisa de adolescente
Uma amiga minha, com dois filhos pra criar, me conta que está trocando e-mails com um cineasta charmoso, aquelas coisas que caem do céu de uma hora pra outra. Ela me diz com todas as letras: "estou me sentindo uma adolescente!"
Numa novela, outro dia, o mesmo texto: mulher recém-separada, mais de 50 anos, declarando-se apaixonada feito... feito o quê? Feito uma advogada, feito uma manicure, feito uma professora? Não, feito uma adolescente.
Nem eu escapo. Outro dia, recebi uma cantada de um guapo nada desprezível, e do alto dos meus 43 anos - 16 de casada -, me senti igualmente uma menina. Ora vejam, só por causa de uma cantada inocente que não levou a nada, só por causa da nostalgia que me provocou.
Qual é? Agimos como se apenas os adolescentes tivessem o direito de vibrar. Como se adrenalina correndo nas veias fosse um direito exclusivo deles. Como se homens e mulheres maduros não pudessem se divertir, não pudessem azarar sem compromisso, não pudessem se presentear com instantes de total curtição. Quem declarou que isso seria um desajuste? Nós mesmos, quem mais.
Entusiasmo não é coisa de adolescente: é coisa de gente grande. Vou além: é coisa de gente velha, inclusive. Coisa de adolescente é depender de ajuda financeira dos pais, passar a madrugada bebendo cerveja em posto de gasolina, andar sempre em turma. E até isto não é propriedade privada deles. Mas entusiasmo, vibração, paixonite? Que insistência burra esta nossa ao afirmar, cada vez que vivemos algo novo e excitante, que estamos em surto de adolescência. Isso sim é falta de maturidade. Os maduros de verdade sabem que estão sujeitos a vibrações em qualquer etapa da vida. Alguém está morto aí? Eu, não.
Sei que é difícil, mas vou tentar nunca mais dizer que um entusiasmo é "coisa de adolescente". É desrespeitoso com eles, que quase sempre amam com mais intensidade do que nós. E desrespeito conosco, porque nós, os que julgam que tudo viram e tudo sabem, ainda iremos nos surpreender muito nesta vida.