Esperança de Viver
A vida é uma nebulosa de dúvidas onde pouco se vê e pouco se entende. Não adianta desdobrar um roteiro para ler o seu futuro, não adianta revirar uma gaveta com a intenção de ressuscitar o seu passado. Certas portas não possuem uma chave e às vezes, viver de cacos e rabiscos pode ser a melhor das fugas.
Somos como um livro esquecido nas areias do tempo. Somos pó, um pedaço de papel, a magia em forma de palavras. Fazemos parte do desconhecido, adormecemos na penumbra perpétua. Somos ignorados, somos a capa cor de vinho que não condiz com as letras douradas. Talvez não somos nada, nem ninguém, para alguém. Mas sempre existe um outro alguém e esse ninguém nos encontrará. Seremos folheados e nossos lábios dirão o que as palavras insistem em negar: um romance, que se desvenda além do corpo e da mente. Não é para ser lido, mas sentido.
Eu preciso disfarçar que não sinto mais falta. É sombrio isso, a saudade não é um parque de diversões, é como um fósforo riscado diante do combustível. Tudo explode, a vida torna-se uma pilha de cascalho e você se arrasta entre os cacos da dor refletida em milhares de espelhos. O vazio te alcança e a pessoa em questão desaparece de vista no outro lado da alma.
Ser confiante em algo tem lá suas desvantagens. O fato de confiar nas pessoas que estão presentes em seu círculo vicioso faz de você um ser ingênuo. Mas se isso é algo bom, restam algumas montanhas para serem escaladas e objetivos para se cumprir. Você certamente não deixou todas as suas cicatrizes neste planeta, está apenas começando.
Apesar de negar o contrário, eu sempre desejei cada pedacinho da sua atenção. Provavelmente vou enlouquecer sentindo o cheiro da sua pele assombrando meus pulmões. Talvez eu tente convencê-la a voltar, ouvindo um não, que ilusoriamente será o feito mais saudável desde que você me jogou nesse túmulo de lembranças. Sairei quando for possível, empurrando palavras contra minha garganta, sabendo que o pior já se passou. Sinto a saudade em meus ossos, em cada cicatriz impregnada na parede, em cada pensamento descrito na porta. Ficarei sóbrio, enquanto eu tentar salvar a mim mesmo. E quanto a esse orgulho, não se sinta negligente ou imprudente, não tente refazer seus passos igual um fantasma, o passado estará sempre lá para te assombrar.
Tenho desistido de muitas coisas, mas não de mim mesmo. Sei o que não vale a pena, o que não me completa. E se continuo indo a algum lugar é porque restaram alguns sonhos. Ninguém vive só de pessoas e reciprocidade, elas se vão e amor enche de erva daninha. Não é uma dor física, é algo que rasga a alma e rabisca o papel. Simples assim, as palavras saem como um tiro de canhão, não desejam mais nada, apenas vitalidade. Amor próprio é aquele que você encontra quando tenta carregar um peso vazio, um peso que nem sempre condiz com a sua tristeza.
Vejo o espelho e encontro eu mesmo. Nesta jaula mental eu permaneço aprisionado. Olho para minha criança interior e sussurro: cuidado com os sonhos. E eu seguro ela para ela não chorar, diante de olhos que se tornaram geleiras. Minha fraca respiração guia o vento, enquanto eu destruo o inquebrável. Liberdade, para um coração que é um oceano e pensamentos que são uma galáxia. Apenas observo os imbecis, porque é assim que me sinto: perdido, nessa selva sádica onde todos falam, mas ninguém entende nada.
Acredito que você precise chegar no fundo do poço para entender, que é fácil qualquer um dizer que já chegou até lá. Embora nunca se pegou olhando para essa coisa chamada ódio e gritou com toda a sua fúria, saia daqui.
Qualquer felicidade dura apenas um pequeno momento. Ela se vai como uma folha carregada pelo vento ou como um raio que ilumina o horizonte. A felicidade que me refiro não cabe numa única palavra, é um abraço seu que pode simplesmente desaparecer como um pássaro no céu. E quer saber, essa felicidade está muito distante, mas para toda distância existe um ponto de encontro. É esse ponto que eu preciso alcançar.
Olha só, você sempre disse que não daríamos certo por causa das diferenças, por menores que elas fossem. E por ironia, foi esse julgamento que nos afastou. Não era preciso ser nenhum gênio para perceber que a diferença entre um remédio e o veneno é a dose, a diferença entre vencer e perder é a vontade e que a diferença entre os opostos é apenas uma questão de aceitação. Mas agora, quem não quer juntar as extremidades e entender sobre fatos sou eu, afinal, passamos a ser distantes quando a falta de igualdade vira falta de interesse.
Diariamente eu chego à conclusão de que a melhor forma de viver em uma pessoa não é necessariamente ao lado dela, mas nela em si. Quando damos algo a alguém, somos praticamente um parasita que não se vai até o último suspiro. Corroemos memórias, vivemos em feridas que cicatrizam e renascemos a cada carta retirada do fundo da imaginação. Cuidado com esses rostos cansados, ali se escondem sonhos que se foram, sorrisos que nunca mais se entrelaçaram e beijos que caíram no inevitável. Pois de fato, tudo o que dissemos e fizemos é marcado para sempre em alguém. Somos como poetas mortos que eternizam no que não se pode mais tocar.
Quando se está só por muito tempo, é perigoso demais buscar companhia sem entender o que se deseja, é como enfiar seu braço numa caixa cheia de serpentes esperando tirar de lá felicidade. Não adianta, o veneno da solidão corrompe seu ego se você não amar a si mesmo. E outra, é inviável estar com alguém somente por estar, a confiança torna-se uma droga alucinógena.
A verdade é que se você for fundo demais, não existe ninguém que não seja tocado com palavras. Dá para derrubar uma muralha muito bem com o assobio certo.
E então, eu não sentia culpa, muito menos falta. Percebi que não eram as pessoas que estavam indo embora, mas eu que já havia partido faz muito tempo.
Algumas pessoas vivem pedindo para que eu escreva sobre a felicidade e lá vou eu encontrar razões para expressar ou comprovar isso. Mas a dura verdade é que a paz não pode ser explicada, pois na maioria das vezes é um estado de espírito onde voltamos à estaca zero cravando adagas no coração. E sim, me referi à paz. O seu olhar é como um lar e a sua companhia uma dúbia realidade, talvez doce, talvez amarga. E é isso que na maioria das vezes ninguém percebe, não é preciso dizer eu te amo para provar que se ama, não é preciso sorrir para demonstrar algo que está explícito perante dois olhos. Felicidade verdadeira é como o inverno ou o verão, sempre vai ter um meio termo ou um oceano de dúvidas entre as emoções. Mas eu prefiro acreditar que ser feliz não depende de algo, pois nunca se sabe o que se soma ou some.
E então, já havia acontecido tanta coisa. Caído no fundo do poço, discutido com o vento, retornado do além do tempo, aberto um frasco de saudade, chorado para não se afogar. Tudo isso, coisas que de fato pareciam ser o ideal ou os ideais. Não havia muito mais a se fazer. Era uma guerra contra você, e no meio de um tiroteio a única alternativa era sair com os braços para cima, correndo para ser destrinchado ao seu lado.
Estou recluso, distante de pessoas e com poucas coisas. Sei bem o valor que os mais próximos possuem. Apenas me completam, animam e me fazem prosseguir. O caminho é meu, mas as marcas trilhadas não pertencem somente a mim. Confesso que enquanto admiro alguns de coração, gostaria de sair por ai despedaçando outros ou sei lá, mostrar para cada imbecil o quanto valemos à pena e que pessoas são únicas. Mas infelizmente, apenas existimos enquanto alguém precisa de nós.